Falante e sorridente, Bel Pesce entra na sala de aula a passos apressados. Não fosse pelo olhar cansado, seria difícil acreditar que estava sem dormir há 48 horas. “Para mim, ainda é sábado”, diz ela, para admiração dos vinte alunos que ocupam a sala de aula em uma manhã de segunda-feira.
“Só dormi duas horas”, relata um aluno, seguido por outras declarações semelhantes. Dos caderninhos de anotações para registrar aprendizados do dia a dia até as poucas horas de sono, eles parecem dispostos a tudo para parecer ao máximo com a jovem professora de 25 anos que virou símbolo de sucesso entre empreendedores por ser uma prodígio no mercado de tecnologia.
Depois de sete anos fora do País – cinco deles no Vale do Silício – Bel voltou há dois meses ao Brasil. Conhecida por ter estudado no Massachusetts Institute of Technology (MIT), trabalhado em grandes empresas como o Google e a Microsoft, e participado da equipe que criou nos Estados Unidos a startup Lemon – um aplicativo que funciona como uma carteira virtual e alcançou um milhão de usuários em três meses –, ela lançou a FazINOVA, uma escola para ensinar as habilidades essenciais a quem quer empreender.
A nova startup não tem funcionários. Da elaboração do material didático à emissão de notas fiscais, passando pela negociação de parcerias, divulgação e ensino, é Bel quem cuida de tudo. O que explica, em parte, os dois dias sem dormir. “Essa vontade de agarrar o mundo de uma só vez é a minha cara”, diz.
Até agora, o esforço tem dado certo. O projeto-piloto atraiu 150 pessoas dispostas a pagar mais de R$ 1,8 mil para integrar as primeiras turmas dos cursos de Inovação, Empreendedorismo e Grandes Habilidades. “Achava que ia ter dez alunos, mas precisei encerrar as inscrições antes do prazo porque não dava mais para atender a demanda” conta.
A FazINOVA é um sonho antigo da empreendedora, mas foi só após o lançamento do livro “A Menina do Vale”, em maio de 2012, que ela teve noção da própria fama no Brasil e criou coragem de deixar a operação da Lemon (hoje ela é apenas acionista) para replicar seu conhecimento no País.
Lançado primeiro em versão digital, o livro, que conta as lições aprendidas pela empreendedora no Vale do Silício, teve mais de um milhão de downloads e foi publicado por uma editora. “Coloquei no papel tudo que gostaria de ter aprendido na infância e percebi que as pessoas tinham interesse em aprender aquilo também”, diz. “Lá nos Estados Unidos, todo ano se formam milhares de alunos pelo MIT. Aqui não. Embora também pudesse fazer a diferença lá, aqui tinha mais gente me escutando”, explica.
Investimento
Bel tirou a FazINOVA do papel sem colocar a mão no bolso. Para lançar o projeto apostou na força do seu nome e fechou uma parceria com o Etapa, onde cursou o ensino médio, para usar as salas de aula.
O público-alvo inicial eram os jovens estudantes do próprio Etapa, mas a FazINOVA acabou atraindo uma audiência diversificada, que varia de curiosos a empreendedores experientes, com idades entre 17 e 62 anos. Alguns vêm de longe só para assistir às aulas de Bel.
É o caso de Ezequiel Borges, que mora em Goiânia e veio a São Paulo para fazer os três cursos de uma só vez. Às vésperas do encerramento das aulas de Habilidades, ele comemorava ter criado coragem ao longo do curso para lançar sua primeira startup, a Tokyto.com, um site para vender camisetas estampadas com caricaturas desenhadas por ele. “Esse retorno é muito importante. Falo para os alunos colocarem no currículo que estão me ajudando a montar a escola, porque desenvolvo o conteúdo a partir do feedback deles”, diz Bel.
O plano da “menina do Vale” é ambicioso. A meta no longo prazo é tornar a FazINOVA uma rede de franquias, licenciar o material didático e lançar uma plataforma de ensino à distância. Assediada por empresas, ela já prepara uma versão dos cursos in company e, na segunda quinzena de maio, vai viajar pelo País com uma versão reduzida das aulas.
Outras parcerias também são estudadas. Para o projeto-piloto, por exemplo, ela levou um case da Votorantim para os alunos do curso de inovação buscarem soluções para problemas da empresa.
Ela também contratou uma professora para ministrar algumas das aulas e, aos poucos, Bel quer ir para os bastidores e fazer a escola depender cada vez menos da sua presença na classe para decolar.
É que, apesar de reconhecer que deve muitas oportunidades à fama, Bel prefere ser reconhecida por suas habilidades profissionais. Há duas semanas, por exemplo, um diretor do Twitter ofereceu a ela uma vaga no escritório da empresa no Brasil por ter gostado da pergunta que ela fez ao fundador do site, Jack Dorsey, durante um evento em São Paulo. “Foi algo totalmente meritocrático porque ele me chamou para conversar sem saber quem eu era. E isso me deixa muito feliz”, diz.
Fonte: O Estado de São Paulo
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