Não foi uma semana boa. Começou com o BACEN retirando as travas do IOF para investidores estrangeiros fazerem arbitragem em renda fixa (6% para zero) e terminou com o Standard & Poor´s colocando em perspectiva negativa a nota soberana do Brasil, ainda em grau de investimento, mas podendo ser reduzida em dois anos.
Na visão da S&P, o baixo crescimento da economia brasileira e a má qualidade da gestão fiscal contribuem para esta revisão. Realmente, estamos crescendo pouco e de maneira errada (modelo baseado no consumo), com os investimentos não decolando e o consumo das famílias mostrando perda de dinamismo diante do alto endividamento e a aceleração inflacionária. Para piorar, observa-se “vazamento de renda” na economia, pelo lado externo, com importações (+9%) crescendo mais do que exportações, estas impactadas pela baixa demanda da China (queda das commodities), e adiamento das importações de petróleo, além do aumento de despesas de viagens e de remessas de lucros e dividendos. Até maio, a balança comercial foi negativa em US$ 5,4 bilhões, contribuindo para o aumento do déficit em conta corrente, em torno de US$ 70 bilhões, próximo a 3% do PIB em 12 meses (até abril).
Pelo lado fiscal, o desempenho vem sendo sustentado mais por “gambiarras contábeis” do que por medidas concretas de ajuste, além das desonerações (numa visão de longo prazo, necessárias, mas impactando na arrecadação). Com isto, a meta fiscal para este ano segue revisada para baixo (ou “relativizada”), devendo ficar entre 1,7% e 2,1% do PIB, e não mais 3,1%, como antes firmado.
Claro que com o juro reduzido em 2012, o espaço para uma meta fiscal menor aumentou, já que a dívida líquida do setor público se manteve próxima a 35% do PIB, mesmo com o desempenho fiscal mais fraco, mas devemos ressaltar que com a revisão para cima da taxa de juros de curto prazo, diante das pressões inflacionárias recentes, esta folga deve mudar. Após a ata do COPOM, na semana passada, isto ficou bem claro, ao mostrar preocupação com a “inflação persistente e os mecanismos de perpetuação formais e informais”.
Sobre este tema, cabe lembrar, por outro lado, que o BACEN voltou a atuar de forma mais ortodoxa, mostrando uma postura “tempestiva” no combate à inflação, mas insuficiente para contrabalançar a leniência no front fiscal, com uma política mais frouxa e as chamadas “ações anticíclicas”. Ou seja, o governo segue “cobrindo um santo para despir outro”. Não mostra nenhuma coordenação no mix de políticas fiscal e monetária. O ideal seria adotar uma política fiscal mais austera, cortando gastos de custeio e estimulando investimentos, para não sobrecarregar a monetária, com o BACEN na sua luta contra os excessos da demanda agregada e a oferta insuficiente. Decorrente deste quadro de má gestão das políticas observa-se uma piora na dívida bruta federal, já próxima a 60% do PIB, por incorporar os excessos do Tesouro no financiamento, via BNDES, dos investimentos em infraestrutura e no consumo das famílias.
Dito isto, pode-se afirmar que esta falta de coordenação de políticas vem contribuindo para a piora dos principais fundamentos da economia brasileira, provocando este reposicionamento dos investidores externos e impactos sobre o mercado e a taxa de câmbio. Em maio, o dólar se valorizou em torno de 7% contra o real, em muito dentro de um movimento global, devido à retomada da economia norte-americana e a perspectiva do desmonte da política de compra de títulos públicos pelo Fed (se tornando um mercado mais atrativo), mas também pela perda de credibilidade do governo Dilma.
Lembremos que o Fed, na adoção do terceiro Quantitative Easing (QE), vem irrigando os mercados com colocações mensais de US$ 85 bilhões (troca de títulos por moeda). Desde o primeiro QE, até o atual (o terceiro), já foram cerca de US$ 3,4 trilhões irrigados sobre o mercado doméstico norte-americano transbordando ao mundo inteiro (destaque para os emergentes).
Isto, inclusive, vinha sendo queixa dos países emergentes, com Guido Mantega, inclusive, em discursos nos eventos internacionais, tendo criado a tal “guerra cambial”. Com as políticas monetárias frouxas dos países desenvolvidos (juro no limite de 1% ao ano), “bolsões de liquidez” vêm buscando fazer arbitragem nos mercados emergentes que adotam boas políticas, mas também com taxas de remuneração atrativas. O Brasil entraria neste grupo. O problema é que, de uns tempos para cá, as políticas domésticas vêm perdendo aderência, se refletindo nas reações recentes dos investidores estrangeiros.
Neste cenário de mobilidade de capitais, muitos investidores começam a migrar para os EUA, na reedição do flight to quality, pela segurança e políticas consistentes. Isto pode ser observado no gráfico a seguir, com o aumento da rentabilidade dos títulos públicos norte-americanos (T Bonds) mais demandados, já “precificando” uma taxa de juros, no longo prazo, em torno do patamar médio histórico de 3,0% anuais.
Retornando ao nosso mercado cambial, a cotação do dólar segue apreciada, em torno de R$ 2,10 a 2,15, preocupando o governo, pelo impacto inflacionário que possa ocorrer mais tarde. Caso a visão mais pragmática do BACEN se imponha, acreditamos que este patamar não se sustente no restante do ano, com este mercado se acomodando e a cotação recuando a algo em torno de R$ 2,05 a R$ 2,10.
Concluindo, os movimentos da taxa de câmbio, neste ano, indicam influências globais, com a retomada nos EUA e o desmonte das políticas de estímulo, mas também saídas de investidores externos diante da gestão econômica temerária do governo brasileiro. Sendo assim, é de se esperar novas ações pontuais, como a retirada do IOF para captações externas até 360 dias e para investidores em posição vendida. Neste momento de alta volatilidade, não dá para ter uma visão muito clara sobre os rumos da taxa de câmbio neste ano. Tudo dependerá, no entanto, de como se comportará a economia norte-americana e a política de desmonte do Fed e como o governo Dilma conduzirá sua política econômica, já pensando nas eleições de 2014.
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