Em entrevista ao Instituto Millenium, Eugenio Mussak, professor de liderança e gestão de pessoas na Universidade de São Paulo (USP), analisa o papel da sociedade civil para a construção da política brasileira. O acadêmico pondera que a política não é feita apenas pelos representantes eleitos. Uma parte considerável da força de transformação das instituições depende da atuação dos cidadãos.
Mussak reconhece a insatisfação da população com os governantes como um sinal do amadurecimento da sociedade. No entanto, aponta os caminhos para os eleitores contribuírem efetivamente para as transformações das três instâncias de poder.
Instituto Millenium: Nos últimos meses, as lideranças políticas vêm sendo muito contestadas no Brasil. Para o senhor, as mudanças necessárias ao país dependem de uma troca de representantes ou de uma transformação da própria sociedade?
Eugenio Mussak: Transformações nunca ocorrem rapidamente. O fato de as lideranças políticas estarem sendo contestadas mostra uma evolução no amadurecimento da sociedade, mas ainda há longo espaço a ser percorrido. Não podemos esquecer que os políticos foram eleitos. Isso significa que eles estão em seus cargos como legítimos representantes de quem os elegeu.
Considero que eles são representantes, sim, porém menos pelo aspecto institucional, e mais no sentido de terem emergido de uma sociedade com baixa capacidade de fazer análises críticas. Dessa forma, percebemos que pouco adianta, simplesmente, trocar os líderes se os próximos forem eleitos pelos mesmos princípios de análise que nortearam a escolha dos atuais. Assim sendo, esperamos que a transformação da própria sociedade termine por mudar suas instituições, entre elas, os poderes políticos.
Winston Churchill [primeiro-ministro da Inglaterra durante a Segunda Guerra Mundial], com sua conhecida ironia, disse que “a democracia é o pior regime político, excetuando-se todos os outros…”. Se colocarmos uma lupa nessa frase do líder inglês, poderemos encontrar alguns pontos a discutir sobre esse assunto. Um deles é o fato de que, após serem eleitos, os políticos distanciam-se da sociedade que os elegeu, e criam uma espécie de “república independente”, em que não precisam dar satisfações, pelo menos até a próxima campanha. E isso acontece porque eles se consideram superiores e intocáveis, distanciados do homem comum pela burocracia, pela ignorância e pelo desinteresse.
Imil: Qual o papel da população para mudar esse cenário?
Mussak: O papel da sociedade na promoção das mudanças evolutivas é a vigilância permanente e a manifestação espontânea. Como a sociedade comporta-se de maneira passiva, acaba ocorrendo um acúmulo de descontentamento e de tensão, que acaba rompendo o “dique” da paciência em algum momento. O resultado, como vimos recentemente, pode ser o exagero ou a violência.
Imil: Como assegurar que os brasileiros contribuam para a construção das instituições públicas?
Mussak: Para isso, duas instituições são fundamentais: a imprensa séria e a educação de qualidade. O movimento evolutivo de uma sociedade é lento, e, para garantir sua continuidade, é necessário que a informação e a educação exerçam seu importante papel. Só cabeças preparadas e informadas são críticas, e só corações indignados e esperançosos mobilizam os corpos e elevam as vozes.
Imil: Que aspectos precisam ser levados em consideração quando pensamos no futuro do país?
Mussak: Não posso imaginar um país desenvolvido – que é diferente de um país rico – sem eficiência nos órgãos públicos e sem transparência nas ações dos que ocupam cargos de liderança. É muito difícil viver em um país em que não se pode confiar naqueles que foram eleitos para servir e proteger. Por esse motivo, considero que instituições como o Instituto Millenium prestam um serviço relevante à sociedade e ao futuro.
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