“O Chile é a grande história de sucesso na América Latina, com sua gradual e sólida redemocratização e a bem-sucedida transferência para a população dos frutos do rápido desenvolvimento econômico”, destaca O GLOBO em seu editorial “Sem sobressaltos” deste domingo, por ocasião do segundo turno das eleições presidenciais do país.
O Chile avança célere nos trilhos da Grande Sociedade Aberta, novo paradigma da civilização ocidental. De um lado, temos a herança das democracias liberais — o regime parlamentar, o estado de direito, as economias de mercado. E, de outro lado, a herança das grandes religiões e, ironicamente, do socialismo que tanto as combateu: a solidariedade, as redes de proteção social por meio de ações descentralizadas do Estado. As ideologias radicais estão superadas por essa síntese, que vai muito além da esquerda e da direita.
O modelo econômico liberal do Chile, arquitetado por economistas de Chicago, produziu uma taxa média de crescimento de 6% ao ano por mais de duas décadas, reduzindo a taxa de chilenos situados abaixo da linha de pobreza dos 50% no início dos anos 80 para os 15% atuais. A integração competitiva na ordem econômica globalizada, a austeridade fiscal, o banco central independente, o câmbio flexível, as privatizações, as reformas de legislação trabalhista e da previdência, a concentração de gastos públicos em funções críticas do Estado (segurança, saúde e educação) e na remoção das desigualdades sociais (foco na eliminação da pobreza e na promoção da igualdade de oportunidades) criaram uma nova sociedade.
As taxas de crescimento chilenas estiveram entre as mais altas do mundo, as políticas sociais foram as mais avançadas e o grau de corrupção é dos mais baixos. As alianças políticas são orgânicas: o ex-presidente Eduardo Frei carrega a bandeira da solidariedade com os social-democratas e os democratas-cristãos, enquanto o empreendedor Sebastián Piñera levanta a bandeira da eficiência com os liberais-democratas e os conservadores.
O mais importante é que nem mesmo as sucessivas vitórias da coalizão dos partidos de esquerda representaram ameaça ao modelo econômico liberal, responsável pelo formidável desempenho da economia chilena. O que se discute a cada eleição é a dosagem da ação social do Estado na remoção das arestas deixadas pelo mercado.
Pelo fato mesmo de a economia ter exibido vigorosas taxas de crescimento, o pêndulo político esteve por 20 anos com a social-democracia, de modo a atenuar as desigualdades de oportunidades por meio de políticas públicas. Mas, agora, no momento em que se mostra ameaçada a continuidade do processo de criação de riqueza, o pêndulo eleitoral se inclina para a liberal-democracia, de modo a impedir a fossilização da política, a estagnação da economia e a interrupção da dinâmica de mobilidade social.
(“O Globo” – 18/01/2010)
Agora sim, Dr. Guedes, (quase) bem colocado. Apens um reparo: a sociedade aberta, justamente por isso, não se restringe a trilhos, essas prerrogativas de esquerda e direita.
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