A alfabetização entrou no radar do Ministério da Educação, felizmente. No século 21, o Brasil ainda não resolveu essa questão que os países industrializados deram conta já no início do 19. Precisamos juntar forças, mobilizar a sociedade e ultrapassar essa quadra vergonhosa da nossa educação.
Não há segredo para alfabetizar crianças. Nos países com sistemas educacionais eficazes, cerca de 10% a 15% delas se alfabetizam de maneira informal, e isso ocorre especialmente onde leitura e livros são parte do cotidiano, mas o processo independe de nível intelectual ou de recursos econômicos da família. Apenas 5% ou menos têm alguma dificuldade – aqui incluídos os casos de dislexia, relativamente raros. A maioria conclui o 1º ano escolar lendo e escrevendo como deve. Por que empacamos?
Há três razões principais e todas ideológicas. Desde a década de 60 nossos educadores foram seduzidos por dois grandes equívocos. No campo pedagógico, vicejou a ideia de que ninguém ensina nada a ninguém e que o aluno precisa “descobrir” o conhecimento, inclusive, tal como o famoso Champollion da pedra Rosetta, redescobrir o código alfabético. A segunda foi uma confusão conceitual entre “ler” e “compreender”: confundiram o objetivo de aprender a ler com o seu processo de ensino. Para ler e compreender é preciso saber ler. Mas isso continua desapercebido entre nós. A ideologia fala mais alto. Educadores e gestores da educação insistem nesses equívocos. A terceira razão do atraso, impulsionada por ONGS poderosas e movimentos sindicais, está associada ao lema da “Alfabetização na Idade Certa” para tirar da escola a responsabilidade de alfabetizar os alunos no 1º ano, a única idade certa.
Os entraves são superáveis. Há uma ciência cognitiva da leitura tão robusta quanto a ciência que permite colocar o homem no espaço e trazê-lo de volta à Terra com segurança. Esta provê os conhecimentos e pistas suficientes para desenvolver programas eficazes de alfabetização. O código alfabético do português brasileiro apresenta dificuldade média, nada que não se possa aprender em um ano. Há no país instrumentos e iniciativas de eficácia comprovada para alfabetizar crianças.
O MEC conseguirá liderar o esforço necessário para colocar as coisas no trilho? O histórico não é promissor. Em 2003, a comunidade acadêmica e o ministério ignoraram relatório de especialistas nacionais e estrangeiros apresentado em seminário na Câmara dos Deputados. Em 2007/2008, Fernando Haddad, então no MEC, tentou colocar a alfabetização na agenda, mas foi voto vencido. O tratamento que o tema recebe na BNCC é um desastre. O PLND – Programa Nacional do Livro Didático criou tantas normas e exigências que eliminou o autor e impossibilita a produção de qualquer material didático consistente. A Secretaria de Alfabetização da era Bolsonaro produziu documento competente, mas repetiu o erro de reinventar a roda, e a fizeram quadrada.
A grande fonte de inspiração se encontra em iniciativas de comprovado sucesso que vêm ocorrendo em vários municípios do país. Há poucas, mas suficientes para separar o joio do trigo, o que comprovadamente dá certo e é replicável em escala. Sobral é um desses casos – há 20 anos já fez o seu dever de casa.
Nada mais precisa ser inventado. Basta o MEC acolher e estimular a implementação de estratégias de sucesso comprovado.