Desde o inicio da crise financeira em 2008, o Governo vem adotando um sem número de medidas com o objetivo de incentivar a atividade econômica. A última novidade é a possibilidade de o governo flexibilizar a exigência de índices de nacionalização nas encomendas da Petrobras para que a empresa possa acelerar seu programa de investimentos, contribuindo para o crescimento da economia. O plano de negócios da empresa prevê investimentos de US$ 236,5 bilhões até 2016, e a empresa vem encontrando dificuldades em implementá-lo, simplesmente por não haver disponibilidade no mercado doméstico dos bens e serviços compatíveis com esse nível de investimento.
O estabelecimento de conteúdo local com o objetivo de incentivar o desenvolvimento de setores ligados à cadeia do petróleo é legítima e desejável. No entanto, a definição desta política deve ser concebida no âmbito de um projeto de política industrial, visando a aumentar a eficiência, a produtividade, o emprego e a qualificação de mão de obra no longo prazo, além de atrair empresas especializadas para o setor. Não se deve cair na tentação de partir para o protecionismo industrial, que levaria a cadeia da indústria a aumentar o seu investimento apenas no curto prazo.
A adoção de políticas de conteúdo local pode ser observada em diversos países e setores da economia. No caso específico do setor de petróleo e gás, temos vários exemplos de adoção da política de conteúdo local ao redor do mundo. Os casos mais notórios de políticas de conteúdo local de sucesso são o Canadá e a Noruega. Ambas empregando um arcabouço não mandatório, no qual os objetivos principais são garantir a igualdade de condições de tratamento de empresas fornecedoras locais competitivas, além de incentivar o investimento em P&D e a transferência de tecnologia.
A principal crítica à política de conteúdo local da forma que é adotada no Brasil é que, por ser mandatória, tende ao protecionismo industrial, e também a privilegiar a contratação de empresas locais não competitivas. A escolha desse tipo de empresa acaba aumentando o custo dos investimentos, além de gerar atrasos no cronograma do plano de negócios e consequentemente prejudicando o crescimento econômico do país.
A prioridade da política de conteúdo local deve ser aprender e desenvolver o processo produtivo, e não apenas assegurar a destinação de um percentual mínimo dos gastos, sem considerações sobre o conteúdo tecnológico. Seria muito mais produtivo induzir parcerias e transferência de tecnologia que promoveriam a indústria nacional, conforme adotado por países que possuem uma política de conteúdo local não mandatória. Assim, empresas locais estariam em igualdade de condições para competir com as estrangeiras no fornecimento de bens e serviços, o que as capacitaria para serem referências no mercado fornecedor de bens e serviços para o segmento de exploração e produção de petróleo e gás natural.
Embora a indústria nacional fornecedora do setor tenha apresentado um desenvolvimento significativo nos últimos anos, as empresas não tem conseguido suprir a demanda na velocidade e nos custos adequados. Os péssimos resultados da Petrobras, durante o governo Lula, em particular, o fato de nunca alcançar as metas de produção de petróleo prometidas, já deveriam ter sido suficientes para o governo reavaliar a política de conteúdo local. Com uma diretoria de perfil mais técnico na Petrobras, o mercado passou a ter a esperança que a estatal voltasse a construir diagnósticos corretos com relação aos gargalos que tem impedido uma boa performance da empresa, dentre os quais a política de conteúdo local. No entanto, parece que, por caminhos transversos, o governo começa a considerar, mais rápido do que se imaginava, a flexibilização das regras de conteúdo local como mecanismo para induzir um maior crescimento da economia. Nada como uma ameaça de crise para que se abandone os critérios ideológicos e políticos. De toda forma as mudanças serão bem-vindas.
Fonte: O Globo, 18/06/2012
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