Acompanhar a cena política brasileira tem sido uma autêntica prova de paciência. Muitas vezes, dá vontade de largar de mão e ir embora. Fuga? Não, apenas uma busca legítima de uma atmosfera minimamente saudável para viver. Sim, a política no Brasil faz mal à saúde. Vivemos angustiados, irritados e inconformados em ser insistentemente tratados como palhaços. Logo, respeito quem decide ir embora e recomeçar alhures, mas admiro aqueles que ficam para estoicamente lutar.
Indo adiante, se olharmos a política brasileira, veremos que poucos destroem a vida de muitos, condenando nosso país ao atraso, à pobreza e à ladroagem. Exatamente isso, são poucos, muito poucos. O problema é que eles são organizados e cúmplices na usurpação das instituições republicanas. De tempos em tempos, especialmente nos períodos eleitorais, discutem em público e parecem estar em lados opostos. Sabem aquela estória de esquerda e direita? Esqueçam. No Brasil, isso não existe; o lado é único: o poder pelo poder e suas inerentes facilidades.
Portanto, a situação está posta: temos uma política que não representa o cidadão. Durante muito tempo, bastaram as tradicionais ferramentas de manipulação e mentira coletiva; com muita propaganda, enganava-se o povo, e a roda da fortuna continuava a girar. Todavia, com o advento da internet e das redes sociais, tal estratégia de sustentação do poder ficou vulnerável. Hoje, do nada pode surgir uma onda de fervor popular que venha para as ruas e emparede a política estabelecida. Estamos a viver, assim, uma espécie de renascimento da democracia direta que faz tremer as muitas instituições anacrônicas da República.
Ora, quando as ruas fervem, os fios de sustentação do poder começam a derreter. Todavia, não basta destruirmos os museus da corrupção e passar a viver em ruínas. Objetivamente, a democracia exige uma institucionalidade eficaz, sob pena de virar um governo farsante a serviço de interesses ilícitos. E de farsas e ilicitudes já estamos cansados. Dessa forma, o aspecto altamente positivo da redescoberta da força política do espaço público deve ser conjugado com o surgimento de novos líderes confiáveis que, com decência e coragem, adentrem no jogo do poder com o firme intuito de fazer do ideal democrático uma forma concreta de governabilidade responsável e competente.
Por tudo, entramos em uma quadra democrática altamente instável e volátil. Os estáticos mecanismos da política tradicional não mais dispõem de capacidade para responder à velocidade dos acontecimentos sociais. Estamos virando uma página e abrindo outra com muitas linhas em branco. No livro aberto das possibilidades futuras, a qualidade da escrita que virá nos será fundamental e pautará o amanhã das próximas gerações. É, por isso, que a caneta do poder deve estar em boas mãos, pois a beleza histórica da democracia jamais foi firmada por maus políticos.
Fonte: “Estado de Minas”, 28 de fevereiro de 2017.
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