Estamos chegando ao fim de 2021 com desafios importantes no horizonte: a deterioração das condições econômicas é uma realidade inconteste; a persistência ascendente da curva inflacionária forçará a autoridade monetária a utilizar a alavanca dos juros oficiais para estancar a sangria da alta de preços, reinaugurando a tradição do rentismo improdutivo; paralelamente, a situação fiscal do país começa a descarrilar, gerando uma série de manobras legislativas para albergar a irresponsabilidade do gasto público desmedido; como cereja do bolo explosivo, ano que vem é eleitoral e, por certo, nossa ávida classe política abocanhará vultosos recursos pecuniários para colocar gasolina de avião na máquina de reeleições em série. Aliás, já estão falando por aí que o Congresso tentará manter o fundo partidário de R$ 5,7 bilhões. Sim, senhoras e senhores, não é fácil e pode ficar pior.
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Felizmente, o futuro político brasileiro também sopra ventos promissores. Apesar de tudo que já vimos e estamos vendo, a democracia em nosso país parece atingir sua maturidade. Objetivamente, a derrocada petista e o carnaval da corrupção desbragada recompuseram, sem máscaras, o equilíbrio pragmático no jogo do poder. Até chegarem ao Planalto, o PT e seus asseclas se afirmavam como a última bolacha do moralismo político; aberto o pacote, os biscoitos estavam mofados e a ética vencida. Ou será vendida? No benefício da dúvida, hoje sabemos com clareza que político é político, que tem gente boa, que tem gente ruim, que há pessoas dignas, modelares e decentes e, também, os mequetrefes, os safados e mercenários. Enfim, a vida como ela é, entre virtudes e vícios pulsantes.
Aí, chegamos a Jair Messias Bolsonaro, que se apresentou como mito para se alistar eleitoralmente com o PL de Valdemar da Costa Neto. Se vocês, caros leitores, pesquisarem a palavra “mensalão” no Google, encontrarão algumas manchetes inconvenientes. Mas vamos lá: Bolsonaro teve o mérito inegável de correr na cancha reta e vencer o PT, coisa que tucanos graúdos tentaram, tentaram, tentaram e nada. Depois da era FHC, o PSDB, em páreos presidenciais, jogou como nunca para perder como sempre. Deixando tal histórico de lado, importante assinalar que o pleito de 2018 foi totalmente atípico: a estafa com a classe política tradicional abriu o flanco para uma exitosa candidatura antissistema. O problema é que o sistema é movediço e muito mais esperto que retóricas políticas de ocasião.
No amanhecer do pleito de 2022, a pergunta do momento é a seguinte: terá Sergio Fernando Moro capacidade de se apresentar como o candidato da mudança? Quem disser que sabe a resposta está mentido; o panorama é ainda muito superficial, não permitindo análises conclusivas. É claro que o ex-ministro da Justiça possui recall nacional por sua impressionante ação como juiz da Operação Lava Jato, tendo um forte apelo na questão da moralidade pública. Todavia, a forma tumultuada como deixou o governo revelou que a frieza do magistrado não encontrou eco no fígado do homem político. O evento naturalmente lhe deve ter gerado reflexões e aprimoramentos, sendo a habilidade de gerir situações difíceis – sem se corromper – característica fundamental de sobrevivência em Brasília, especialmente no Palácio do Planalto. Na expressão clássica de João Mangabeira, a lógica do magistrado deve encontrar o “descortino do político”.
O fato definitivo – independentemente do desfecho eleitoral – é que seguiremos a conviver com a política e com os políticos. Isso é a essência da democracia que, frisa-se, segue viva no Brasil, apesar de suas imperfeições. E só será menos imperfeita a partir da atuação firme e decidida do civismo ativo – de todos e cada um de nós – em favor de um país mais honesto, sério, comprometido com a livre iniciativa, com a liberdade de empreender e gerar empregos às pessoas, consciente do papel do Estado no combate à pobreza e à miséria extrema, capaz de refundar as bases do ensino e habilitar nossas crianças às lógicas da tecnologia e do futuro, com empresas aderentes aos princípios da boa cidadania corporativa, tendo na lei o referencial necessário para uma sociedade justa, fraterna, solidária e que jamais abdique do crescimento econômico com seus inerentes ganhos sociais.
Sim, a democracia é algo muito valioso para depender exclusivamente da classe política. O verdadeiro ideal democrático reside na força individual do cidadão que, movido por sentimentos que nos fazem humanos, é capaz de construir relações virtuosas que, unidas e somadas, ganham ressonância na vida vivida, tornando-se, assim, aptas a transformar realidades que pareciam imodificáveis. Então, além de votar, é preciso ser diariamente cidadão. Participar, criticar, fazer acontecer. Democracia é ação concreta, consciente e responsável. Afinal, os políticos sempre estarão lá. Mas onde estamos nós?
Fonte: “Gazeta do Povo”, 13/12/2021
Foto: Aniele Nascimento/Arquivo/Gazeta do Povo