O atual movimento que se engendra para enfraquecer as funções do Conselho Nacional de Justiça pode deixá-lo à mercê dos tribunais locais
Quando da discussão da emenda constitucional nº 45/ 2004, antes da formulação do anteprojeto e durante a sua tramitação no Congresso, combati o denominado controle externo da magistratura, em artigos, inclusive para a “Folha”, e em audiência pública para a qual fui convidado pelo então presidente da Comissão de Constituição e Justiça, senador Bernardo Cabral (PFL-AM).
A emenda constitucional nº 45/ 2004, todavia, não estabeleceu um controle externo da magistratura, mas sim um controle interno mais eficiente (com nove magistrados e com a colaboração de quatro membros da OAB e Ministério Público, e apenas dois representantes do Congresso Nacional).
À evidência, a solução foi inteligente, tendo me colocado, de imediato, a defender tal poder correcional, que poderia agir originária, concorrente e simultaneamente às corregedorias ou conselhos de cada tribunal.
Aliás, o artigo 103-B, parágrafo 4º, inciso III da Constituição declara que a sociedade pode reclamar diretamente ao CNJ “contra membros ou órgãos do Poder Judiciário”, neles incluídos serviços auxiliares, e o inciso V, que cabe ao CNJ “rever de ofício ou mediante provocação os processos disciplinares de juízes e membros dos tribunais julgados há mais de um ano”.
A experiência dos primeiros anos, sob a presidência dos ministros Nelson Jobim, Ellen Gracie e Gilmar Mendes, foi excelente, agindo o CNJ rigorosamente de acordo com a interpretação que dou aos dois incisos.
Ocorreu, portanto, nos cinco primeiros anos de sua atuação, um desventrar de realidades que o povo desconhecia, demonstrando o CNJ que se, como disse a ministra Ellen Gracie em recente entrevista, o Poder Judiciário é o menos corrupto dos três Poderes, a corrupção também nele existe, com inúmeras condenações, aposentadorias compulsórias e afastamento de magistrados.
Sem saudosismos, estou convencido de que a imagem do Poder Judiciário de hoje não se aproxima àquela do período em que comecei a advogar, quando os magistrados falavam exclusivamente nos autos e eram raros os casos de corrupção.
Mesmo assim, concordo com a ministra Ellen Gracie que é o menos corrupto dos poderes, para isto tendo concorrido o CNJ, nas questões mencionadas, por exercer um trabalho purificador, destacando-se nele, atualmente, a figura severa, mas justa, da ministra Eliana Calmon, corregedora do conselho.
Há em curso, todavia, um movimento para enfraquecer as funções do CNJ, entendendo que o órgão deveria examinar o comportamento ético dos magistrados apenas após pronunciamento de órgãos disciplinadores dos tribunais, o que, de certa forma, desfiguraria a instituição, pois ficaria à mercê dos tribunais locais, exatamente contra cuja inércia foi criado o CNJ. Em outras palavras, a emenda constitucional nº 45/2004 perderia todo o seu significado.
Ou pode o CNJ originária e/ou concorrentemente examinar processos de condutas dos magistrados, ou a sua manutenção perderia sentido.
Fonte: Folha de S. Paulo, 02/09/2011
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