A conhecida ”lei de Gerson” não vai desaparecer da noite para o dia, mas melhora a renda e torna o brasileiro menos propenso às fraudes por necessidade, aponta estudo
Desde a mais remota civilização a fraude faz parte do dia a dia da humanidade. Para quem duvida, basta lembrar a história de Esaú e Jacó, logo no começo da Bíblia. Com certeza não foi a primeira fraude, mas é das que serve de exemplo, da mesma forma que o “Cavalo de Troia” se transformou no símbolo da esperteza grega e em lição de como se deve agir para ganhar uma guerra.
A fraude não é um privilégio brasileiro. Ao contrário, ela está disseminada em todo o mundo e, entre outras coisas, serviu de base para a construção do sistema previdenciário norte-americano, que foi montado levando em conta o sucesso de uma grande “corrente da felicidade”, desbaratada pela polícia no início do século 20, para criar o conceito da bicicleta, ou, no caso da previdência social, a regra pela qual os que estão trabalhando pagam as aposentadorias dos que atingiram a idade de parar de trabalhar.
A engenhosidade humana é ilimitada e, por alguma razão ainda não muito clara, fica mais aguçada todas as vezes que o objetivo é levar algum tipo de vantagem. Num certo sentido, pode-se até dizer que o segundo Tratado de Tordesilhas, que dividiu o mundo entre Espanha e Portugal, garantido por uma “Bula Papal” assinada por um papa espanhol, não foi mais do que uma esperteza do rei D. João II de Portugal. Como o Tratado não identificou a ilha da qual a distância para se traçar o meridiano deveria ser contada, Portugal acabou ocupando uma larga porção de terra sul-americana, que, com base no tratado original e na boa vontade do Papa, deveria pertencer a Espanha.
As estatísticas de todas as seguradoras, independentemente do país de origem, levam em conta os níveis das fraudes. A razão é simples: existem fraudes que não são comprováveis e outras, cujo valor não justifica a apuração. Então, no preço de todo seguro há um porcentual preestabelecido para fazer frente a elas.
Por conta desta realidade, que, se for mal avaliada, pode ter forte impacto no resultado das seguradoras, a Confederação Nacional das Seguradoras – CNSeg – encomendou uma pesquisa cujos resultados são extremamente interessantes. De acordo com ela, a intenção do brasileiro fraudar o seguro diminuiu.
É um dado importante e que tem, com certeza, entre outras razões, amparo na realidade nacional. Como o Brasil está se tornando mais rico, o padrão de vida das pessoas tem sofrido sensível elevação. Com mais dinheiro no bolso, é possível fazer frente a um maior número de compromissos, ou seja, há uma diminuição da necessidade de se virar a qualquer custo, com a transferência deste custo para as companhias de seguros.
Não que o uso da carteirinha do plano de saúde emprestada pelo melhor amigo vá desaparecer. Não vai, como também não desparecerão outras práticas que são parte da rotina do brasileiro.
Ninguém espera que a “caixinha” para o policial não multar suma do dia para a noite, da mesma forma que ninguém tem a ilusão de que a ideia de levar vantagem, conhecida como a “lei de Gerson”, vá desaparecer do nosso dia a dia. Pessoas continuarão furando filas, cambistas misteriosamente continuarão tendo os melhores ingressos para os melhores espetáculos, e por aí a fora.
Mas a fraude por necessidade, esta, com base na pesquisa encomendada pela CNSeg, deve cair. É preciso não esquecer que o maior patrimônio das pessoas que estão subindo na escala social é seu nome limpo. O nome limpo é a garantia do acesso ao crédito. E o crédito de longo prazo é a mola que está fazendo milhões de brasileiros saírem da pobreza. Para eles, ser honesto é a grande “esperteza”.
Como são estas pessoas, em função de seu ingresso maciço na atividade econômica nacional, que estão se tornando os novos segurados, é de se esperar que efetivamente a atividade seguradora brasileira apresente, quem sabe já no próximo ano, um menor índice de fraudes, o que terá impacto positivo no preço final dos seguros mais contratados, como seguro de automóvel, seguro de vida, seguro saúde e seguros residenciais.
Fonte: O Estado de S. Paulo, 05/09/2011
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