Eles estão tentando salvar a Terra e você está atrapalhando.
Você teima em abrir a torneira da pia para lavar as duas mãos ao mesmo tempo. Insiste em ligar diariamente o chuveiro. Consome oxigênio sem parar, e dá o que em troca ao planeta? Só gás carbônico, agravando o efeito estufa.
Eles ainda vão criar o Dia Mundial Sem Você.
Por enquanto, existe o Dia Mundial Sem Carros, e parece que estão planejando um Dia Mundial Sem Elevador. Resumindo, quanto menos coisas o ser humano fizer, melhor. De preferência, no escuro.
A Hora do Planeta é uma dessas tentativas de corrigir a aberração que é a vida que você leva. Desse jeito, meu caro, melhor as trevas. E não fique achando que vale o escurinho do cinema ou um blecaute romântico a dois. É sem ar-condicionado.
Mas não se sinta, ao aderir, um herói da economia de energia – outra coisa que você, consumista, teima em sugar do planeta. Não há economia alguma, porque o apagão do bem não foi programado para um horário de pico. Você não está salvando um kilowatt sequer.
A causa é muito mais nobre: está em jogo a sobrevivência dos marqueteiros do fim do mundo. Ao apagar a luz e entrar na corrente moderninha (uma espécie de pirâmide do apocalipse), você está salvando o emprego de pelo menos um eco-burocrata – e evitando que ele tenha idéias piores.
O slogan da Hora do Planeta é incisivo: “De que lado você está?” É natural que perguntem, no escuro não dá para enxergar mesmo.
Diga logo que você está do lado do planeta (até porque a lei da gravidade te obriga), e que não tem nem notícias do que se passa do outro lado, a não ser pelas mensagens do Chico Xavier.
Pronto, você já não é mais um capitalista selvagem perdulário. Está livre do purgatório ecológico. O último que sair acenda a luz.
(Publicado em “Época”)
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