Essa turma é composta por vários grupos que sempre encontram uma justificativa para o governo gastar mais. Tem o pessoal “antenado”, que defende seguirmos o exemplo dos países avançados e pisar no acelerador de gastos. Só lembram da experiência internacional quando é conveniente. Silenciam sobre experiências e discussões nos países ricos sobre a qualidade da ação estatal por meio de: avaliação de políticas públicas (cairia bem na discussão sobre renovar a desoneração da folha), identificação de seu benefício para a sociedade (faltou na ampliação do Fundeb, que basicamente privilegiou o aumento da folha de ativos e inativos) e existência de medidas alternativas mais eficazes (políticas mais adequadas que a Zona Franca de Manaus para a preservação da Amazônia e o desenvolvimento da região).
Também fecham os olhos às diferenças entre os países. Os pobres têm menor capacidade de gasto e, portanto, de endividamento do que os ricos, principalmente se exibirem baixo crescimento. Interessante notar que “PIB per capita” e “taxa de crescimento do PIB” são variáveis com grande peso para explicar a nota de crédito dos países. O Brasil, na lanterninha dos emergentes, se sai mal em ambos os critérios.
Há o grupo da “disrupção”, que defende que a teoria econômica caducou, sendo o momento de rasgar os manuais e buscar alternativas como, por exemplo, a emissão monetária para financiar os gastos públicos.
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É compreensível algum grau de experimentalismo na política econômica em tempos de crise. É arriscado, porém, prosseguir com eles sem evidência de sua eficácia, especialmente em países emergentes, onde o custo de equívocos é maior. Que a criatividade seja melhor utilizada para boas políticas públicas.
Há a “velha guarda”, de esquerda e direita, que defende maior ação estatal em tempos de suposta crise do capitalismo. Curiosa recomendação em um país de capitalismo capenga, que precisa ser reforçado com vistas a maior liberdade para empreender e à concorrência, e o flagrante fracasso do Estado brasileiro. Aumentar Estado ineficiente é proposta perigosa.
Tem a turma das “bancadas” associadas a interesses setoriais e de segmentos da sociedade que acredita que basta despender mais recursos para se eliminar as mazelas do País. Problemas ambientais, de saúde, educação, segurança, cultura, etc; tudo se resolve com mais gastos públicos. Não discute formas de utilizá-los de forma mais eficiente. A falta de dinheiro é desculpa para tudo: ponte que cai, museu que pega fogo, teste de covid-19 que não chega. Mal comparando, é equivalente a propor a volta da CPMF: uma medida que promete resolver problemas sem muito esforço, mas ao custo de perpetuar distorções.
O aumento de gastos no Brasil tem gerado mais despesas com a folha e desperdício, e não benefício à sociedade.
Finalmente, há o pessoal dos “direitos adquiridos”. A casta de servidores públicos – destacadamente do sistema judiciário – não só não aceita contribuir com a fatura da crise paga pelo setor privado, como também não perde a chance de pedir mais recursos e privilégios. E com o beneplácito da esquerda. Exemplo recente é o TJ-SP que pleiteia um aumento de 55% no orçamento, basicamente para gasto com a folha.
Os grupos parecem não se preocupar com as consequências de suas propostas sobre a carga tributária e os juros, e frequentemente são omissos em relação às reformas necessárias para conter os gastos obrigatórios. Pior, a elite do funcionalismo bloqueia discussões sobre a redução de seus privilégios e, muitas vezes, toma decisões em benefício próprio.
Esse quadro reverbera no Congresso. Aumentar gastos é fácil, sendo que muitos têm caráter permanente. Sua contenção requer consensos, o que anda difícil. Os tachados de “terroristas fiscais” estão isolados.
A turma do gasto tem sido historicamente vitoriosa, pois só fazem ajuste quando se instala uma crise fiscal. Desta vez, corremos o risco de aumentar os gastos mesmo em meio à crise.
Fonte: “O Estado de São Paulo”, 13/8/2020
Foto: Gabriela Biló / Estadão