Presto sinceras homenagens à estadista Angela Merkel, chanceler alemã da melhor estirpe política, afeiçoada à clareza e sensível à opinião de seu povo. A vida de Merkel não tem sido fácil. Perdeu o pai recentemente, pelo que consta, uma figura forte para Angela.
Perdeu também o apoio de alguns importantes colaboradores – como o economista Jurgen Stark, do Banco Central Europeu, representando a Alemanha. Vários abandonaram o time de Merkel por discordar do modo como que ela vem conduzindo a negociação com a Grécia, com mão muito dócil, na visão desses críticos e ex-aliados.
Por uma dessas coincidências, conheci Merkel e Stark brevemente, numa curiosa reunião da Fundação Konrad Adenauer, realizada em Berlim, há alguns anos. Angela Merkel já era, na época, uma prestigiada ministra do então Chanceler Helmut Kohl, ótimo professor de política e responsável por gastar muitos bilhões de marcos para realizar o sonho alemão da integração das duas Alemanhas, desafio por muitos criticado como dispendioso demais e até impraticável.
Achavam que o lado comunista seria meio preguiçoso e incapaz de acompanhar o ritmo do lado ocidental. Ângela era um dos “preguiçosos”. E Jürgen Stark, um funcionário graduado do Bundesbank, o Banco Central alemão. Não me peçam para relembrar detalhes de um encontro de dia inteiro, falado em “deutsch”.
Minha participação se resumiu a desagradar profundamente, quando resolvi lembrar aos circunspectos debatedores (Merkel já deixara o encontro) que os imigrantes, de cujos gastos de saúde e previdência eles tanto reclamavam, seriam os sujeitos que casariam com moças alemãs e dariam um empurrãozinho no crescimento demográfico do país que estava ficando idoso, rico e rabugento. Óbvio que jamais fui convidado para qualquer outra coisa lá. Mas acho que disse algo pertinente, com o olhar do tempo.
Apesar de custarem caro e serem, aparentemente, um estorvo social, os imigrantes que povoam a base de pirâmide social são relevantes por ser a massa que sustenta a turma dos andares de cima.
Os alemães da reunião estavam exasperados com a gastança fiscal com imigrantes, poluidores do seu ambiente impecável. Mas tenho certeza de que Merkel, se ainda estivesse presente, como alemã oriental que um dia também foi considerada excessiva na foto, defenderia um ponto de vista mais centrado. Imigrantes que vêm se integrar são bem-vindos pois pagam sua conta na saída do almoço.
Que isso tem a ver com a Alemanha de hoje? Tudo. Lá está a mesma Merkel, não querendo rifar os gregos (e portugueses, e outros) contemporizando o extremismo alemão, que não perdoa os que falham na vida, maus devedores, gastadores contumazes, infiéis ao regime da boa conduta.
Os eleitores ameaçam abandonar Merkel, como fez o empertigado Stark, se ela continuar abonando a falta de vontade dos gregos de morder a faca e partir para um sangrento ajuste de sua apagada economia. Merkel está dividida, crucificada entre o extremismo calvinista e a moleza do perdão de dívidas. Nessa perspectiva, Merkel sofre mais do que o primeiro-ministro grego.
Ela é quem perde o sono e poderá perder as eleições, por ter equilíbrio e bom senso. Felizmente, no parlamento alemão, a última decisão lhe deu suporte para tentar manter o euro e seus sócios, todos vivos. Vai custar muito caro. Mas esta péssima saída ainda é a melhor, para Merkel e para os alemães. Torço por ela.
Fonte: Brasil Econômico, 07/10/2011
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