Por certo, grande parte dos leitores desse jornal, se não a maioria, sabe explicar o que é ajuste fiscal, sejam economistas ou não. Contudo, nestes tempos de crise política e de baixa popularidade do governo –e da classe política em geral–, interessante é saber o que pensa a classe C.
As pessoas que ingressaram na classe média sabem o que é ajuste fiscal? Entendem o esforço que o ministro Joaquim Levy está fazendo? Compreendem o alcance das ações de política econômica, as razões que explicam por que o país enfrenta quadro desalentador? Afinal, o governo está sabendo explicar para parte muito relevante do eleitorado brasileiro a razão de ser das políticas econômicas que hoje advoga?
Pesquisa realizada pela Ideia Inteligência em parceria com a Vertude revela alguns fatos interessantes. Em primeiro lugar, entre cerca de 2.000 entrevistados, 58% disseram não saber o que significa “ajuste fiscal”, mesmo tendo ouvido a expressão nos noticiários e nos jornais.
[su_quote]Se o governo soubesse explicar que aquilo que está tentando fazer é mais ou menos semelhante ao que as famílias fazem quando falta dinheiro no fim do mês, a instabilidade imprevisível que assola o país talvez pudesse ser amenizada[/su_quote]
Ainda que a maioria das pessoas entrevistadas não saiba o que significa ajuste fiscal, todas souberam explicar muito bem o que fazem para equilibrar as contas quando falta dinheiro no fim do mês: cortam gastos. Mais especificamente, 62% de todos os entrevistados, incluindo os 41% que sabiam explicar o que era ajuste fiscal, afirmaram que reduzem despesas quando o orçamento fica apertado. Apenas cerca de 30% admitiram não pagar as contas, fazer bico ou trabalho extra, ou pegar empréstimos quando falta dinheiro.
Questionadas sobre acreditarem que o governo fazia o mesmo que elas quando o orçamento minguava, a resposta foi um categórico não. Alguns disseram que, em vez de cortar despesas, o governo aumenta impostos; outros afirmaram que o governo “toma do trabalhador”; uns tantos falaram que o governo pega empréstimos; por fim, um punhado foi taxativo: “O governo rouba”.
Neste momento em que muitos confundem a baixa aprovação do governo com uma não comprovada vontade popular de que Dilma deixe o cargo, a percepção da população sobre o ajuste fiscal é mais do que relevante. Se o governo soubesse explicar que aquilo que está tentando fazer é mais ou menos semelhante ao que as famílias fazem quando falta dinheiro no fim do mês, a instabilidade imprevisível que assola o país talvez pudesse ser amenizada.
Mais do que isso, se o governo soubesse explicar que, para equilibrar as suas contas, é necessário cortar gastos e que isso pode ter repercussões negativas para algumas famílias no curto prazo, talvez a mentalidade de “populismo econômico” que tomou conta do país (e de alguns economistas) pudesse ser diluída, poupando-nos dos desperdícios vistos nos últimos anos.
Dizem os jornais que, para debelar a crise política e melhorar a percepção do governo, a presidente estaria cogitando uma redução significativa de ministérios. Embora os economistas saibam que o efeito disso sobre os gastos totais do governo seja pequeno, a carga simbólica é inquestionável.
Corte de ministérios, na cabeça da população, equivale a corte de despesas, tal qual dizem fazer no fim do mês quando necessário. O gesto não resolverá os problemas do país, mas por certo pode servir para amainar o clima impregnado de mágoas, ressentimentos, a agonia paralisante que se apoderou do Brasil.
Fonte: Folha de S. Paulo, 13/8/2015
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