“Quando eu era menino, falava como menino, sentia como menino, discorria como menino, mas tão logo cheguei a ser homem, acabei com as coisas de menino.” (São Paulo, 1 Coríntios 11:13)
A repercussão da tragédia ocorrida em Angra dos Reis e Ilha Grande, na virada do ano, revelou uma clara tendência da opinião pública para achar que tudo poderia ter sido evitado, bastando que as autoridades tivessem agido de forma adequada e preventiva. Será que isso é verdade?
Alguma culpa os governos têm – e eles sempre têm! O olhar negligente, populista e demagógico das autoridades sobre a ocupação e o desmatamento desenfreados das encostas é criminoso. Assim, as mortes nas favelas de Angra não só poderiam como deveriam ter sido evitadas.
Já o caso da Ilha Grande, onde houve maior número de vítimas, foi muito diferente. Ali não havia desmatamento nem ocupação desenfreada de encostas. As fotos aéreas dos locais mostram claramente as cicatrizes deixadas pelas avalanches sobre a mata verde, intocada. O problema foi que choveu uma enormidade. Uma chuva torrencial e extraordinária. Não houve falha ou negligência, mas uma ocorrência natural fortuita, com a qual a humanidade convive há milênios.
Naquele mesmo período, o noticiário internacional foi dominado por fortíssimas nevascas e ondas de frio intenso, que acometeram europeus e norte americanos, causando centenas de mortes. Da Suíça, por exemplo, chegaram notícias de grandes avalanches em estações de esqui, com várias vítimas fatais. Será que o governo suíço, tido como um dos mais eficientes do mundo, deve ser responsabilizado por tal tragédia? Deveria este mesmo governo, de forma preventiva, proibir a construção de novas estações nos Alpes, novos hotéis e pousadas, a fim de evitar outras ocorrências do tipo, como muitos pretendem fazer aqui, em relação ao polo turístico da Ilha Grande?
Definitivamente, parece que inculcaram na opinião pública a cruel esperança de que o Estado é capaz de nos manter eternamente protegidos e seguros. Enquanto a habitual inépcia, a permanente negligência e a recorrente corrupção dos agentes públicos geram louváveis reações de revolta, tais reações, paradoxalmente, trazem consigo um clamor exagerado por mais e mais intervenções, regulamentações e restrições legais sobre a atividade econômica e a propriedade privada, como se já não bastasse o indefectível furor legiferante dos governos.
A lembrança que me vem à mente, sempre que deparo com a reação de cidadãos adultos que, atemorizados diante das notícias de um trágico fenômeno natural, bradam por mais intervenção estatal, a fim de manter-nos todos protegidos e seguros, é a dos meus filhos, ainda pequeninos, assustados por monstros imaginários durante a noite, berrando pela minha proteção, sem saber que seu pai estava muito longe de ser o super-homem que imaginavam. No caso dos governos, a coisa é ainda pior, pois eles são os próprios algozes. Querem nos tutelar, não são fiéis, não são sinceros, não obedecem as suas próprias leis. Embora necessários, eles precisam ser constantemente vigiados e controlados pela sociedade, e não o inverso.
Benjamim Franklin costumava dizer: “quem abre mão da liberdade, em nome de alguma segurança, não merece nem uma nem outra”. A liberdade pressupõe algum tipo de risco. Mesmo a mais comezinha das atividades, como um passeio na praia, apresenta riscos à vida ou à saúde. Se nos deixarmos paralisar por eles, seremos nada mais que escravos do medo.
Uma sociedade onde a liberdade é abandonada em prol da busca por uma segurança extremada (e jamais alcançável), é uma sociedade fadada ao fracasso. Um dos motores do progresso humano é a coragem para enfrentar riscos. Colombo jamais teria chegado à América, Santos Dumont nunca teria voado e o homem não teria pisado na lua, caso não assumissem riscos. Dói pensar que estejamos nos transformando numa enorme massa de gente amedrontada e passiva, dominada pela pueril expectativa de que a quimera da segurança absoluta possa ser provida por um Estado-Babá.
Pessoas maduras não abrem mão da responsabilidade de comandar o destino de suas vidas. Esse comportamento adulto, no entanto, parece ter sido deixado de lado por muitos, se não a maioria, na vã esperança de que um governo todo-poderoso seja capaz de fazer por eles aquilo que deveriam fazer por si mesmos. Aquela atitude madura, de que nos fala São Paulo, parece cada vez mais distante. É o medo, e somente o medo, que predomina.
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