Um mecanismo indireto de propaganda política na internet chamou a atenção do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e acendeu o alerta para possíveis irregularidades neste período de pré-campanha. Apoiadores de pré-candidatos à Presidência estão arrecadando dinheiro para promover, nas redes sociais, páginas não-oficiais, por meio de sites de financiamento coletivo que não estão autorizados pela Justiça Eleitoral.
A lei determina que as campanhas de arrecadação aconteçam em sites cadastrados no TSE — hoje, são 50 endereços. A lista foi adotada como uma forma de manter o controle sobre a identificação dos doadores, já que é obrigatório manter uma lista atualizada com nome e CPF. Um grupo de eleitores de Jair Bolsonaro (PSL) e outro de Marina Silva (Rede), no entanto, estão angariando recursos por meio do “Vakinha”, um dos principais sites de crowdfunding do país, mas que não está habilitado a desempenhar um papel nesta eleição.
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A reportagem procurou outras páginas de vaquinhas virtuais fora do cadastro do TSE, com campanhas de apoio ao conjunto dos pré-candidatos à Presidência, mas não encontrou comportamento semelhante. Há duas semanas, “O Globo” mostrou que páginas não oficiais de Bolsonaro pagam para impulsionar publicações favoráveis ao candidato.
No caso de Bolsonaro, o objetivo é, entre outros, impulsionar as publicações da página do “Movimento Brasil à Direita”, que tem 879 mil seguidores no Facebook. A campanha foi divulgada no “Jornal da Direita”, site mantido pelo mesmo grupo, que publica textos favoráveis a Bolsonaro e a outros pré-candidatos do PSL. “Precisamos de dinheiro para abrir um CNPJ, pagar a manutenção do site, pagar por artes dentro das páginas e para novos editores; também para comprar material para difundir a imagem de Jair Bolsonaro e de seus apoiadores”, diz o texto que pede a contribuição. A meta é chegar até R$ 5 mil, dos quais R$ 1.110 já haviam sido arrecadados até a noite de ontem.
No caso da campanha mantida por um apoiador de Marina, o objetivo é arrecadar R$ 10.805, dos quais R$ 450 já foram doados. “Com a sua contribuição, iremos alavancar a nossa página do Facebook e iremos reforçar a militância nas redes sociais”, diz o texto que defende a doação para promover a página do Facebook Marina Silva 2018.
IMPULSIONAMENTO À MARGEM
Além da proibição de financiamento coletivo fora dos sites cadastrados, a prática esbarra em outro item da lei eleitoral: só candidatos ou partidos podem pagar para promover posts nas redes sociais. A legislação estabelece que o impulsionamento de conteúdo é permitido desde que “contratado exclusivamente por partidos, coligações e candidatos e seus representantes”. O texto determina as normas a partir de 16 de agosto, data do início oficial da campanha, mas, para o professor de Direito Eleitoral do Ibmec-RJ Robson Maciel Jr., a prática também não deveria acontecer agora.
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— Vejo com muita desconfiança a legalidade desse método de vaquinha para impulsionamento. Isso não está regulado pela legislação eleitoral e pode configurar abuso de poder.
O TSE ainda não analisou nenhum caso específico de financiamento coletivo por meio de sites não autorizados ou de promoção de publicações por pessoas físicas. Ao ser avisado sobre as campanhas no site Vakinha, o Tribunal reforçou que uma “empresa sem cadastro não poderia estar operando a captação de doações para campanhas eleitorais, pois não atende a um dos requisitos da lei”. O TSE informou que, para avaliar o caso concretamente, seria necessária uma representação.
Campanha de financiamento coletivo de página de apoio a Marina – Reprodução
Em maio, o ministro Admar Gonzaga, do TSE, disse ao site “Poder 360” que o impulsionamento configuraria propaganda antecipada. “O grande risco é você antecipar o caixa dois no período pré-eleitoral. A Justiça Eleitoral tem encontro marcado com essa questão, e creio que será em breve, porque isso já está transbordando no permissível legal. E tem mais: isso pode se converter, se comprovado o uso indevido de recursos, em abuso de poder econômico já no período pré-eleitoral”, disse o ministro.
Para Robson Maciel Jr., a Justiça Eleitoral deixa o cenário indefinido.
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— A Justiça Eleitoral tem procurado estabelecer uma relação mais próxima com o Google, Instagram, Facebook, mas a internet é um campo muito vasto — afirma o professor do Ibmec-RJ.
Em nota, Marina Silva destacou que “a vaquinha não está autorizada e nem vinculada à pré-campanha ou à Rede”. A campanha informou que vai mandar uma notificação jurídica para o autor pedindo que a campanha saia do ar. A assessoria de Bolsonaro não retornou o contato. O site Vakinha negou qualquer problema, afirmou que as campanhas mencionadas são destinadas à “militância política” e que têm aval do TSE. O site autorizado pelo TSE, no entanto, é o “Doação Legal”, mantido por uma empresa diferente. As duas firmas têm três sócios em comum.
Fonte: “O Globo”