Em discurso feito ontem na cerimônia de posse dos novos presidentes dos bancos federais, o presidente Jair Bolsonaro anunciou que haverá transparência nas operações dessas instituições financeiras, com divulgação de todos os contratos. Isso é impossível.
A transparência é um dos princípios fundamentais da realização de atos do governo, mas há limites impostos por lei, seja por questões de segurança nacional, seja pela necessidade de proteger a privacidade dos cidadãos e das empresas.
Em todo o mundo, a lei protege o sigilo bancário de operações passivas e ativas realizadas com seus clientes. No Brasil, essa regra está no primeiro artigo da Lei Complementar nº 105, de 10/1/2001, que atualizou a legislação anterior.
Ao contrário do que muitos pensam, há restrições institucionais ao poder do chefe de governo em um sistema democrático. Bolsonaro não pode determinar o que ditam os seus instintos. Ele certamente está bem-intencionado ao recomendar a total transparência das operações dos bancos públicos, mas a lei está acima dele.
Imagine o leitor que todo e qualquer empréstimo que realizar em uma instituição como o Banco do Brasil ou a Caixa Econômica Federal, ou todo investimento de seus recursos em fundos por eles administrados, possam ser expostos à curiosidade de todos, inclusive de pessoas com quem não mantém relações de amizade ou parentesco.
Leia mais de Maílson da Nóbrega
Reforma da Previdência deve ser um único projeto
Riscos da venda direta de etanol aos postos
Bolsonaro: Risco político ainda é a grande dúvida
Além do mais, diferentemente do BNDES, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica não costumam emprestar dinheiro do governo. Seus recursos provêm essencialmente da captação junto a pessoas físicas, empresas, organizações e bancos, no país e no exterior.
Deve-se lembrar, ainda, que a lei complementar 105 prevê punições para os que violarem o sigilo bancário. A lei abre exceção apenas aos casos decorrentes de autorização judicial. O acesso também é permitido ao Banco Central, nas hipóteses que a lei especifica, mas o BC não pode divulgar publicamente as informações assim obtidas.
Em resumo, o governo não pode escancarar o sigilo bancário a seu bel prazer, seja por qual motivo for.
Fonte: “Veja”, 08/01/2019