Maduro tem que cair e o Brasil é parte interessada nisso. Seu regime comete violações sistemáticas de direitos humanos e da democracia. Seu desgoverno provocou o colapso social do país, com inflação fora de controle, fome e miséria galopantes. A consequência são massas de refugiados buscando os países vizinhos e instabilidade para toda a região. Sua aliança com Rússia e China e intensa militarização traz riscos ainda mais graves.
A queda do regime é condição necessária para a volta à normalidade democrática e a reconstrução das boas relações com países vizinhos. A questão é como podemos ajudar nisso, já que Maduro não vai largar o osso. Vozes da extrema direita do governo, como Eduardo Bolsonaro, já flertam com a ideia da guerra.
Uma intervenção militar externa é tudo que Maduro quer. Uma vez que forças americanas pisem no país, o dilema é inescapável: ou se está do lado de Maduro ou do imperialismo norte-americano. A própria ideia de uma oposição nacional capaz de gerar apoio por força própria deixa de existir.
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Para o Brasil, uma guerra agora seria desastrosa do ponto de vista humano e econômico. E nem se fale do problemão que será administrar a Venezuela uma vez derrubado Maduro: as milícias bolivarianas, o narcotráfico. Teríamos um novo Iraque ao nosso lado? Sem falar que estaríamos capitulando servilmente aos interesses da atual política externa norte-americana, já que a intervenção seria capitaneada por Trump, o ídolo paradoxal de nossos supostos nacionalistas.
Felizmente, o presidente parece dar ouvidos aos militares que o circundam, que defendem a via diplomática. O general Mourão a encapsulou bem nesta segunda (25) no Twitter: “Vamos manter a linha de não intervenção, acreditando na pressão diplomática e econômica internacional para buscar uma solução pacífica. Sem aventuras. Condenamos o regime de Nicolás Maduro e estamos indignados com a violência contra a população venezuelana.”
Maduro caminha para o colapso. Sanções econômicas mais duras e uma porta de saída atraente para os militares que ainda o apoiam devem acelerar sua queda. Guerra, só se formos atacados.
Caindo Maduro, deve assumir Juan Guaidó, presidente interino já reconhecido por nós e diversos outros países. Felizmente, não traz em seu discurso o radicalismo da direita. Guaidó é um social-democrata que admira aspectos do governo Chávez e lamenta os descaminhos de Maduro. Já garantiu à China que, caso ganhe, manterá as boas relações econômicas entre os dois países. Se não se deixar conquistar pelo canto da sereia militar norte-americana, será justamente a voz de moderação de que o país precisa. Há um caminho para a América Latina que não passa nem pelo autoritarismo falido e nem por se reduzir a quintal dos EUA.
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O consenso é quase universal: Maduro tem que sair de cena para que o país volte à normalidade. Destoando disso, apenas PSOL e PT seguem na defesa do regime. O colapso social e as violações sistemáticas de direitos humanos não os comovem (sempre dá para alegar que a mídia mente). Por desumana que seja essa posição, ela seria ao menos compreensível se tivesse algum sentido estratégico. Longe disso: as peripécias de Gleisi Hoffmann em apoio a Maduro não devem conquistar nem um voto sequer e produzem muita indignação no eleitorado. Nossa esquerda, realmente, precisa se reinventar, ou seguirá irrelevante em meio aos debates que movem o Brasil e o mundo.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 26/02/2019