João Henrique é um estudante de 14 anos que talvez, um dia, se torne Presidente da República. Será uma grande sorte nossa porque João quer entender o Brasil. Ele é filho do meu amigo Sardinha, e precisava entrevistar alguém para um trabalho escolar. Poderia ter sido qualquer um, mas o escolhido fui eu. João – que tem o mesmo nome e a mesma idade do meu filho – me mandou sete perguntas inteligentes que eu divido agora com vocês, junto com minhas respostas, na esperança de que elas nos ajudem a entender melhor o que ocorre em nosso país.
1) Na sua opinião, qual a atual situação do país?
O Brasil é um país com enorme potencial. Pode se tornar uma das nações mais modernas e avançadas do mundo. Entretanto, já faz bastante tempo que o país é dominado por um grupo que vive de explorar o trabalho da maioria da população. Esse grupo é formado por uma aliança entre políticos que se revezam no poder e pessoas que se beneficiam desse poder. Isso explica porque a vida para o cidadão comum no Brasil é tão difícil e cheia de obstáculos. Isso explica porque aproximadamente 50% de tudo o que o brasileiro comum ganha com o seu trabalho, ou com o seu negócio, vai para sustentar a máquina do governo e beneficiar os amigos dos políticos que estão no poder.
2) Nossos problemas são históricos ou têm causas recentes?
Nossos problemas têm raízes históricas profundas. Vários autores explicam que as raízes da situação de países como o Brasil estão na herança institucional que recebemos dos países que nos colonizaram. Isso explicaria a diferença entre o desenvolvimento da América Latina e o desenvolvimento da América do Norte. A América Latina foi colonizada pela Espanha e por Portugal, países cujas instituições eram voltadas para exploração do povo e para um enriquecimento de uma pequena classe de nobres. A América do Norte, em comparação, foi colonizada pela Inglaterra, um país onde desde o início do século XIII já começam a se estabelecer claramente os direitos do cidadão, e onde instituições fortes criaram segurança jurídica e permitiram o desenvolvimento de atividades econômicas. Esse desenvolvimento distribuiu a riqueza por toda a população. Não é à toa que foi na Inglaterra que começou a Revolução Industrial.
Isso não quer dizer que os homens que se revezam no poder no Brasil desde a Proclamação da República estejam isentos de culpa. Pelo contrário; tivemos inúmeras oportunidades para recuperar o atraso e não o fizemos. Fizemos o oposto: gastamos enorme esforço e tempo criando desculpas e justificativas para nosso atraso. Criamos, por exemplo, a famosa Teoria da Dependência, que coloca a culpa do atraso da América Latina nas nações desenvolvidas. Um dos principais autores dessa teoria foi o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Em resumo: as raízes dos nossos problemas são históricas, mas esses problemas foram perpetuados e aprofundados pelas decisões populistas e irresponsáveis da nossa classe política.
3) Os problemas do Brasil são comuns a todas as nações ou temos peculiaridades relevantes?
Alguns problemas do Brasil são comuns a vários outros países, como o baixo crescimento econômico, a degradação urbana e o crime. Outro problema brasileiro, que também afeta outros países, é o domínio da mídia, do sistema de ensino e de todo ambiente cultural por uma visão ideológica de esquerda. Mas o Brasil certamente tem características muito particulares, que agravam nossos problemas. Somos um país de extensão continental, com enormes diferenças regionais, governado através de um sistema federativo de mentirinha, com concentração desproporcional de poder nas mãos dos burocratas em Brasília. Somos um país que aprende, há várias décadas, que o criminoso – não importa a perversidade ou a violência do seu crime – é um coitadinho, que cometeu o crime porque não teve oportunidade na vida ou por causa da “desigualdade”. Enquanto as maiores nações do mundo têm leis penais rígidas e um sistema policial e jurídico que funciona com rapidez para punir quem viola a lei, o nosso sistema criminal e penal se torna a cada dia mais leniente e permissivo com os criminosos. O resultado é um nível de criminalidade que não tem paralelo em nenhum país do mundo que não esteja em situação de guerra.
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4) Existem soluções de médio prazo para os problemas do Brasil? Por onde começar?
Existem soluções de curto prazo. A principal delas é uma alteração na nossa legislação penal para acabar com a impunidade que predomina no país, tanto em relação à criminalidade violenta quanto à criminalidade política. No médio e longo prazo, precisamos mudar a nossa cultura e a nossas instituições. Precisamos acabar com o jeitinho brasileiro. Precisamos eliminar o pagamento de propina dos nossos hábitos e costumes. Precisamos exterminar o politicamente correto do nosso pensamento e da nossa linguagem, e começar a dar os nomes corretos aos nossos problemas. Mas, acima de tudo, precisamos entender que a solução dos principais problemas do Brasil não vem do Estado, mas sim da sociedade organizada e dos indivíduos.
5) A Intervenção Federal é um assunto que tem sido bastante discutido recentemente. Para você, a Intervenção Federal é a solução para a crise na segurança publica no nosso Estado?
A crise de segurança pública do estado do Rio de Janeiro é a mesma crise de todo Brasil. Suas raízes estão, principalmente, em uma legislação penal que promove a impunidade e em um aparato policial e jurídico que não tem a estrutura e a eficiência necessárias para combater o crime. O caso do Rio de Janeiro se torna mais complicado devido ao número de territórios que foram tomados pelo tráfico de drogas e pelas milícias. São verdadeiros estados paralelos, onde a Constituição e as leis do país não se aplicam.
Essa é uma situação que existe há décadas e que piora a cada dia. Uma Intervenção Federal, apoiada pelo uso de tropas das Forças Armadas, é a única forma de começar a mudar esse cenário. A mudança definitiva depende dos cariocas, que esse ano vão eleger um novo governador. Essa escolha precisa ser feita com muito cuidado. A intervenção federal não é a solução para crise de segurança pública, mas é a solução para que nós permaneçamos vivos até que o próximo governador tome posse.
6) Este ano teremos eleições em Outubro. Como se apresenta o cenário político do país?
O cenário político do país é de instabilidade total. Se analisarmos com cuidado, veremos um embate entre grupos políticos que até pouco tempo estavam aliados no comando do país. Fatores relevantes são a derrota quase completa das forças da esquerda – que se aliaram nos últimos 13 anos em um projeto político com resultados desastrosos para o país – e o surgimento de forças liberais e conservadores, inapropriadamente chamadas de “direita”, que começam a oferecer novas opções para os eleitores. Ainda teremos muitas surpresas até o dia das eleições, mas tudo indica que presenciamos o início de uma nova era no Brasil.
7) É possível apontar ou identificar as causas dos nossos problemas, e partir daí traçar soluções factíveis, ou estamos à mercê de eventos incontroláveis?
As raízes dos nossos problemas estão na nossa cultura e nas nossas instituições. Paramos o país inteiro durante cinco dias para festejar o carnaval. Paramos o país inteiro durante quase um mês para assistir à Copa do Mundo. Gastamos 30 bilhões de reais na reforma de estádios de futebol para copa de 2014, e 80 bilhões de reais para organizar as olimpíadas de 2016.
Mais de metade das residências brasileiras não tem serviços de água e esgoto. O Estado brasileiro se mete em assuntos que não lhe dizem respeito – como produção de filmes ou exploração de petróleo – e não cumpre quase nenhuma das suas missões mais básicas, que são educação básica, saúde básica, justiça, segurança e defesa do país.
Temos um sistema eleitoral extremamente complicado e confuso, onde você vota em uma pessoa e o seu voto é usado para eleger um outro candidato. Na raiz de todos esses problemas estão, de novo, nossa cultura e as nossas instituições.
Somos um país onde o sonho de 95% dos jovens que se formam é passar em concurso público, de preferência para auditor fiscal da Receita Federal. Somos um país onde as crianças são proibidas de trabalhar – o trabalho infantil é considerado crime – mas essas mesmas crianças estão livres para pedir esmolas nas ruas ou trabalhar para o tráfico de drogas.
A raiz de tudo isso é uma cultura que considera o trabalho como uma coisa negativa, e incentiva e premia a dependência do Estado. Mudemos essa cultura e todo o resto mudará.