Na semana passada, estava sentada num banco, perto de um shopping em São Paulo, quando escutei uma senhora contar para um rapaz que participava de um grupo de WhatsApp “muito sério” e nele, entre outras pérolas, postaram que o grupo político de um dos candidatos fazia rituais nos quais se sacrificavam crianças.
Fiquei perplexa com a (des)informação e, mais ainda, com a pronta resposta que deu quando o interlocutor lhe perguntou se havia conferido a notícia em outras fontes: “Não assino mais jornais, todos mentem muito”.
Por vezes também desconfio do que leio na imprensa e confiro como outras publicações noticiaram o fato sob suspeita. Mas chamou-me a atenção que a desconfiança da sexagenária não incluía redes sociais.
Abro meu Facebook e eis que me deparo com um post recomendando cancelar a assinatura de jornais, com os nomes da maior parte dos periódicos nacionais e o telefone em que o cancelamento pode ser feito.
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O mundo só faz piorar?
Pesquisa recente da Ipsos, “Fake News, Filter Bubbles, Post-Truth and Truth” (notícias falsas, bolhas, pós-verdade e verdade), põe o Brasil em posição bastante desconfortável em nossa relação com falsas notícias: entre 27 países pesquisados, somos o que mais acredita em boatos. Seis em cada dez entrevistados no Brasil afirmaram ter acreditado em fake news.
Nossa ingenuidade parece surgir de uma educação para a cidadania de má qualidade e do viés de confirmação —que nos leva a acreditar de pronto em notícias ou relatos que confirmam nossas crenças— destacado por Steven Pinker em “O Novo Iluminismo”.
Para lidar com isso, David Buckingham, um estudioso de educação digital, preconiza que, aos moldes do que se passa na Inglaterra, se ensine aos jovens como navegar sem riscos e com checagem em fontes seguras nas redes sociais.
Mas, independentemente de nossa credulidade, fica a pergunta: de onde vêm as notícias falsas e esta suspeição no que a imprensa —que tem, convenhamos, maior risco judicial em noticiar boatos sem checagem— publica?
Segundo Timothy Snyder, em seu “The Road to Unfreedom”, apesar de boatos com interesse político terem sempre existido, houve um recrudescimento em seu uso a partir do interesse russo em evitar que democracias prósperas florescessem em seu entorno, o que poderia eventualmente mudar a opinião pública do antigo império nessa direção.
Da invasão da Ucrânia, passando pelo “brexit” e pelas eleições em diversos países europeus até chegar às dos EUA em 2016, as redes sociais foram inundadas de boatos e os autocratas reais ou em projeto passaram a recomendar desconfiança frente as mídias tradicionais, mas não com relação a suas próprias fake news.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 05/10/2018