Jair Bolsonaro sempre abraçou a crença da esquerda e dos adeptos do intervencionismo estatal, segundo a qual estatais “estratégicas” não devem ser privatizadas. Esse conceito de “estratégico” justificou a entrada do Japão na II Guerra, quando buscou preservar o suprimento de petróleo do pacífico, que seus militares julgavam ameaçado pelos EUA.
Controlar áreas “estratégicas” foi uma ideia associada à soberania nacional. Dizia-se também que seriam “estratégico” os setores fundamentai para o desenvolvimento. Qualquer que seja a razão, a preservação de empresas estatais tornou-se uma ideia obsoleta com o desenvolvimento e a globalização. O Japão superou a tragédia da guerra e ficou rico sem ter petróleo ou o controle de sua oferta. Para os japoneses, “estratégico” foi promover educação de qualidade e integrar-se intensamente na globalização.
No Brasil, ainda é difícil entender o que seja estratégico para aumentar o nosso potencial de desenvolvimento e reduzir os níveis de pobreza e desigualdade. Por certo, possuir empresas estatais dificilmente seria a saída. É incrível, assim, que Bolsonaro se prenda ao arcaico conceito de “estatais estratégicas”, que para ele seriam a Petrobras, a Eletrobrás, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica, e invente uma nova regra: privatiza-se apenas as estatais que dão prejuízo, preservando-se as que dão lucro.
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Empresas estatais se justificam apenas para suprir falhas de mercado. Foi o caso de países da Europa no século XIX, que realizaram esforços de industrialização inspirados pelo sucesso da Revolução Industrial da Inglaterra. Já que não possuíam as mesmas precondições inglesas, criaram estatais em áreas essenciais como as de crédito e transporte ferroviário. Todas foram privatizadas no século XX, pois haviam cumprido sua missão. Já não eram necessárias para suprir falhas de mercado.
Ora, manter empresas estatais apenas porque geram lucro é um equívoco monumental. A privatização deve ser orientada pela percepção de que o setor privado pode assumir o controle de empresas estatais e suprir, de forma mais eficiente e barata, os bens e serviços providos por essas empresas. Deve-se lembrar que a Petrobras dava lucro no período em que foi submetida aos esquemas de corrupção promovidos pelos governos do PT.
A privatização deve levar em conta o interesse nacional. E nada mais importante do que evitar desperdícios e o uso político de empresas estatais. É preciso, pois, promover sua privatização, mediante modelos que permitam o melhor resultado para o Tesouro e evitar que monopólios estatais sejam reproduzidos no setor privado. Se a sociedade não estiver convencida da medida, cabe desenvolver campanhas educacionais para conquistar sua confiança nas vantagens da privatização.
Por definição, não há empresa estatal que gere lucros de forma eficiente. Todas pagam o preço do controle estatal, do custo das regras de licitação pública e das mudanças frequentes de gestores. Estabelecer que estatal que dá lucro não pode ser privatizada é o fim da picada.
Fonte: “Veja”, 10/10/2018