Segundo o presidente Jair Bolsonaro, em pronunciamento, o entrevero entre ele e Rodrigo Maia, presidente da Câmara, não passou de uma “chuva de verão. O dia está lindo!”
Pode até ser. Estas chuvas são torrenciais, mas momentâneas. O problema é que costumam, também, produzir estragos. Se formos viver de chuvas de verão a todos os momentos, acabará não sobrando nada. Muitos chegaram a temer pela governabilidade do País, já que com a reforma da Previdência entrando no limbo, a deterioração fiscal se tornaria inevitável, Paulo Guedes pegaria seu boné e as pressões contra o governo se tornariam insuportáveis.
No fim, intervenções providenciais dos militares e do ministro da Economia, participando, inclusive, de uma audiência na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, serviram para quebrar um pouco o gelo e amenizar o mau humor reinante.
Tudo começou depois de Bolsonaro se negar a negociar com a “velha política”, meio que colocando o Senado e a Câmara no mesmo “balaio de gatos”, de políticos fisiológicos e corruptos. Levou um safanão que acabou se refletindo na aprovação da PEC do Orçamento impositivo, parada desde 2015. Desastrada também foi a decisão de Paulo Guedes de não ir à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, o que acabou mal interpretado pelos deputados. Na verdade, sua negativa partiu da constatação de que a base de apoio do governo estava totalmente desorganizada, não havia relator na Comissão e seria preciso um “freio de arrumação” para evitar que ele, indo a CCJ, fosse massacrado. Não foi esta a interpretação da maioria dos deputados, que acabaram “lendo” tal ato como um desprezo pelo Poder Legislativo.
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A aprovação da PEC do Orçamento Impositivo foi uma resposta a isso, com acachapantes votações contrárias ao governo (448 e 453 votos nas duas). Interessante que deputados do PSL resolveram votar a favor desta PEC, fugindo de uma derrota ainda mais vergonhosa, tentando passar a impressão de que esta era, também, uma pauta do presidente.
Piorou ainda mais, o tom de ironia do presidente nas redes sociais falando do “drama pessoal” do presidente da Câmara Rodrigo Maia, depois da prisão do seu sogro Moreira Franco pela Polícia Federal (em seguida, tanto ele como Michel Temer, e mais seis investigados, acabaram soltos por Habeas Corpus).
Em resposta a este imbróglio todo, a turma “do deixa disso”, liderada por Paulo Guedes, logo tratou de colocar “panos quentes”, tentando reaproximações com o Congresso. Muitos já consideram, inclusive, que Guedes, junto com Maia, é o novo articulador do governo no Congresso pela negativa de Bolsonaro de sê-lo. Na verdade, no seu “destempero” inevitável, ele não parece ser o coordenador ideal das articulações do seu governo. A capacidade de convencimento dele é zero. É sincero em alguns momentos? Pode ser, mas chama atenção seu despreparo para o trato pesado com o Congresso. Muitos argumentariam que Jair Bolsonaro tem “tempo de estrada”, nos seus 28 anos como deputado no Congresso, mas sempre atuando na segunda linha da casa, defendendo interesses corporativos, das Forças Armadas, além de pregações pelos bons costumes e a família. Ou seja, sempre foi um político do baixo clero e sem grande liderança.
Um fato a considerar, e nós já víamos comentando muito sobre isso neste espaço, é que Bolsonaro não tem o direito de se perder nestas picuinhas menores, muito menos cair nas provocações quase que diárias da mídia nacional, como urubus sempre atrás de uma carniça (buscando lapsos neste governo). Como bem disse ele, no início do mandato, “este governo não tem o direito de errar”. Daí a necessidade de caminhar com muita cautela, leveza até, evitando provocações ou confrontos.
A agenda econômica está colocada em cima da mesa. É pautada, primeiramente, na reforma da Previdência. Como boa parte dos desajustes fiscais do País estão centrados na trajetória das despesas obrigatórias, sendo as com benefícios totalizando mais de 50% do total, parece-nos claro que a estabilização destas despesas e da dívida pública têm como pressuposto o ajuste do regime previdenciário. Daí o empenho de todos da área econômica.
Não poderíamos deixar de ressaltar também a importância do tal “Pacto Federativo”, pensado por Guedes, mas é importante estar atento que a PEC do Orçamento Impositivo, aprovada na Câmara na semana, foi meio que um tapa na cara a esta proposta do ministro. Guedes queria começar a desvincular parte das despesas, hoje carimbadas a determinadas receitas, enquanto que esta PEC aprovada na Câmara dá aos políticos amplos poderes para a obtenção de recursos para suas emendas. Perde totalmente o governo a capacidade de investir ou de definir onde deve alocar recursos.
Mesmo neste terreno pantanoso e tendo-se um presidente muito inábil nas negociações e no tratamento dos temas, ainda dá para se esperar algo deste governo, já que a agenda econômica meio que se impõem como inadiável. Se a reforma da Previdência não passar, o prazo de validade do governo se reduzirá consideravelmente, com muitos acreditando que nem completaria este primeiro ano de mandato, tal a má vontade da imprensa e também dos vários desencontros e amadorismos nas ações.
A reforma se encontra agora na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), um relator já foi escolhido, a admissibilidade deve acontecer até o dia 17 de abril, para depois ser enviada para a Comissão Especial e, em seguida, ir à votação no Plenário da Câmara.
Depois, o mesmo trâmite deve se seguir no Senado, passando por duas Comissões e indo a votação. Por ser tema constitucional (Projeto de Emenda Constitucional, PEC) são necessários dois terços dos votos nas duas Casas, ou seja, 308 na Câmara (para um total de 513) e 54 no Senado (81). Cálculos políticos estimam que ao fim deste primeiro semestre ou no início do segundo, esta “contenta” estará definida. Assim esperamos.