Em duas semanas, os candidatos que não concorrem à reeleição serão obrigados a deixar seus cargos no Executivo, e a campanha eleitoral entrará numa nova fase. À medida que a especulação sobre as candidaturas cede lugar à realidade, eis as questões ainda em aberto, que darão rosto ao pleito:
Até onde vai Alckmin?
É certo que o governador paulista será o candidato do PSDB. Incerto é se convencerá o eleitor. Era esperado, a esta altura, um desempenho melhor nas pesquisas de opinião. Se passar ao segundo turno, as chances de Alckmin são boas contra qualquer candidato. Seu desafio é chegar lá. Isso dependerá da estratégia que adotará na campanha, ainda indefinida. Ao que tudo indica, Alckmin dividirá seu campo eleitoral e ideológico com ao menos três outros candidatos: Michel Temer, Rodrigo Maia e Henrique Meirelles. A fragmentação não é um bom presságio para ele. A dificuldade de se distinguir dos demais também. A força de Alckmin está na base partidária e nas alianças regionais. Mas ela não oferece nenhuma garantia de que sua candidatura esteja a salvo do naufrágio.
Quem herda os votos de Lula?
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva estará impedido de concorrer pela Lei da Ficha Limpa, a não ser que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) invalidem sua condenação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) antes do prazo limite para registro da candidatura, dia 15 de agosto. O mais provável, portanto, é que ele indique algum petista para ocupar seu lugar – como o ex-prefeito paulistano Fernando Haddad – e faça o possível para participar da campanha fora da cadeia. Mas isso não garante que o ungido herdará seus votos. Cada estrada bloqueada, cada agressão com ovos ou tomates, cada vez que Lula precisa desviar de seu caminho para fugir de manifestantes deixa mais claro que o PT não tem mais a força política de outrora. Sem Lula na cédula, enfraquece ainda mais. A maior dúvida é quem conquistará o eleitor que deposita sua fé em Lula, sobretudo nas classes mais baixas. Outro candidato de esquerda, como Ciro Gomes ou Guilherme Boulos? Ou o deputado Jair Bolsonaro, com sua campanha radical contra o crime e pela moralidade? Se a história serve de lição, é bom lembrar que o voto de classe baixa era, até o sucesso de Lula, conservador e vinculado à segurança pública. O esperado é que parte relevante do eleitorado de Lula desencantado com o PT migre para Bolsonaro. Não se sabe em que proporção, nem se bastará para tirar o PT ou qualquer outro candidato de esquerda do segundo turno.
Leia mais de Helio Gurovitz:
Lula solto, STF na lona
Como entender o fascínio com o chavismo?
O Facebook e a eleição de 2018
Com quem fica Temer?
A mesma força da gravidade que compele Temer a candidatar-se se encarregará de mantê-lo fora do segundo turno. Uma das poucas certezas a esta altura da campanha é: ele não tem a menor chance de ser eleito, em virtude de seus baixíssimos índices de popularidade. Seu objetivo com a candidatura é outro. Qual? Defender seu “legado”? Ou manter o foro privilegiado para driblar a Operação Lava Jato já em janeiro de 2019? A única forma de obter isso seria negociar algum ministério ou cargo protegido, em troca de seu apoio ao vencedor no segundo turno. Temer poderia, portanto, tanto ficar com Alckmin quanto com Bolsonaro. Pela situação do MDB nos estados, mais provável com o primeiro que com o segundo. Mas não há garantia de que Alckmin passe do primeiro turno. Isso torna a decisão de Temer ainda mais complexa. As forças emedebistas estarão, como de hábito, dispersas de acordo com as conveniências regionais. Seu maior capital, o controle da máquina federal, perde valor a cada dia que passa. Não há estratégia que lhe garanta uma saída honrosa.
Com quem fica Maia?
O mesmo problema de Temer é vivido por dois outros “nanicos do centro”, Maia e Meirelles, ambos sem a menor chance de passar ao segundo turno. Encurralado pela candidatura do chefe, Meirelles não tem muito para onde correr. Como não tem voto nem grupo político, seu caso é mais simples: a tendência é murchar. Maia está diante de um dilema mais complexo. O natural teria sido ele optar por uma candidatura a deputado, que o mantivesse na Presidência da Câmara no próximo mandato. Ao escolher a Presidência, distanciou seu partido do aliado tradicional, o PSDB de Alckmin. O único motivo razoável para isso é resguardar-se e manter canais abertos para outras alianças. No fim, Maia terá de escolher entre Alckmin e Bolsonaro. Já dialoga com ambos. Pelo tamanho de seu partido, pelo espaço que ocupa no Congresso e pela capacidade de articulação, seu papel poderá ser decisivo no segundo turno – e ele sabe disso.
Que fará Bolsonaro?
Sem Lula no páreo, Bolsonaro se torna o favorito, de acordo com todas as pesquisas. Num dos cenários possíveis – em que Lula consegue um registro provisório, mas seus votos são anulados depois –, ele poderia até vencer no primeiro turno, se obtiver algo como 30% da votação. Mesmo esse patamar, contudo, será um desafio para ele. Se quiser vencer, precisa transformar sua imagem de radical e fazer concessões. Precisa entrar no jogo da política que tanto diz abominar. Não é um movimento impossível. Um arco de alianças que inclua DEM, legendas menores e nacos de MDB e PSDB seria fundamental para ele ganhar a musculatura partidária que não tem. Também precisaria de um programa que funcionasse como a Carta ao Povo Brasileiro funcionou para Lula em 2002. Bolsonaro não preocupa tanto pelo aspecto econômico, como Lula. Nesse ponto, a participação do economista Paulo Guedes em sua campanha serve para lhe conferir um verniz liberal – ainda que nem todos tenham se convencido pela conversão súbita do nacional-desenvolvimentismo aos cânones da Escola de Chicago. Preocupam, isso sim, a proximidade das Forças Armadas, a postura em relação aos direitos humanos e a apologia do regime militar. Tudo isso é motivo mais do que suficiente para questionar o compromisso de Bolsonaro com as instituições e a democracia. Se não mudar em tais temas, dificilmente montará as alianças de que precisa não só para vencer, mas sobretudo para governar. Não se sabe se será capaz. Tudo leva a crer que o Bolsonaro de hoje se parece mais com o Lula de 1989 do que com o de 2002.
Fonte: “G1”, 26/03/2018