Apesar das condições econômicas ainda frágeis e de a crise fiscal ameaçar o fôlego da recuperação, o ano de 2017 surpreendeu positivamente. A confiança de empresários e consumidores avança.
O comportamento das contas externas, no entanto, não empolga. Indicam que o investidor local está cauteloso; muito mais que o estrangeiro. E isso representa um desafio para candidatos a presidente.
O “hiato financeiro”, que registra as operações liquidadas de entrada e saída de recursos do País, ficou negativo em U$ 6,2 bilhões em 2017. Focando apenas no fluxo financeiro, que exclui o movimento de mercadorias e serviços para fora do País, houve saída líquida US$ 2,5 bilhões.
Essa cifra negativa não deve ser tomada como sinal de desinteresse do estrangeiro (não residentes, no jargão técnico) pelo Brasil. Os estrangeiros investiram US$ 64,4 bilhões nas várias modalidades de investimento; US$ 9 bilhões a mais em relação a 2016.
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A principal modalidade foi o investimento direto, que engloba a participação no capital de empresas locais e os empréstimos entre empresas (intercompany). Foram US$ 65,2 bilhões em 2017 (pela metodologia do hiato financeiro). Houve inclusive aumento da participação (market share) do Brasil no investimento direto global, após o tombo de 2015. Enquanto o investimento direto no mundo caiu 16%, no Brasil houve aumento de 8%, segundo a Unctad.
Nas demais modalidades de investimento estrangeiro – como Bolsa, renda fixa e empréstimos – o quadro melhorou. Depois de uma saída de US$ 13,8 bilhões em 2016, o total foi de apenas US$ 0,8 bilhão de saída em 2017.
É verdade que a participação dos estrangeiros na dívida pública federal se reduziu em US$ 11 bilhões. Por outro lado, a taxa de rolagem de empréstimos externos não foi nada mal. Atingiu 99% ante 64% em 2016. Tomando apenas o financiamento ao setor privado, a rolagem foi de 101% ante 70%.
Não há sinal de fuga de recursos de estrangeiros. Pelo contrário, há alguma confiança desses investidores.
O mesmo não pode ser dito dos investidores locais (residentes). Pudera, os brasileiros viveram o trauma da crise dos últimos anos e sentem mais as incertezas eleitorais e o risco de retrocesso na agenda econômica.
Os investidores locais enviaram US$ 68,6 bilhões ao exterior em 2017; US$ 22,5 bilhões a mais em relação a 2016, em que pese a natural busca por diversificação de investimentos e oportunidades no exterior.
O que mais chama a atenção são os “créditos comerciais e adiantamentos” (US$ 45,9 bilhões), que são em boa medida recursos de exportadores mantidos no exterior. Já a saída de investimentos em carteira (Bolsa, renda fixa, fundos de investimento) atingiu R$ 10,4 bilhões.
Para 2018, o Banco Central está relativamente otimista, pois projeta entrada líquida de US$ 23,3 bilhões na conta financeira, ante a saída de US$ 2,5 bilhões no ano passado. Isso graças ao investimento líquido dos estrangeiros, que deverá atingir US$ 89,9 bilhões, segundo o BC, sendo US$ 72 bilhões de investimento direto.
Faz sentido o otimismo do BC. A economia deverá exibir maior vigor em 2018, empurrando a confiança dos agentes econômicos para o campo otimista. Segundo nossos estudos, essa é uma variável-chave para explicar a entrada de recursos no País, junto com os preços das commodities. O diferencial de juros é menos importante.
Tem muito dinheiro na mesa dos investidores brasileiros. Além dos recursos no exterior, os locais estão com muitos investimentos domésticos concentrados no curto prazo. As chamadas operações compromissadas acumulam R$ 1,04 trilhões.
Em tempos de crise fiscal e enorme demanda por investimento em infraestrutura, seria sábio tentar atrair esses recursos, a começar com um discurso eleitoral responsável dos candidatos a presidente.
Nessa eleição que poderá ser menos ruidosa do que se imagina, fruto do amadurecimento do debate econômico, caberá aos candidatos não apenas conquistar o eleitor, mas também acalmar quem investe no Brasil.
Fonte: “O Estado de S. Paulo”