Sobre o assalto à Sara Jóias: por que bandidos assaltam em uma rua movimentada em plena luz do dia? Porque têm certeza da impunidade.
O desastre da segurança pública brasileira pode ser resumido nessa palavra: impunidade. O sistema de justiça criminal do Brasil é incapaz de lidar com a realidade das ruas. A impunidade é a regra, não importa se o criminoso usa uma arma para assaltar em um ponto de ônibus ou se sofisticados esquemas para fraudar licitações.
Os dados são chocantes: 92% dos 60 mil homicídios anuais nunca são esclarecidos, e os autores de 98% dos quase 2 milhões de assaltos registrados anualmente nunca serão identificados. Há 700 mil mandados de prisão pendentes. Ser assaltado é a experiência definidora da brasilidade. Medo é o nosso denominador comum.
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Nos crimes de corrupção, a impunidade é garantida pelos inúmeros recursos possíveis (só no caso do ex-senador Luis Estêvão foram 34), pelo foro privilegiado e pelas decisões de cortes superiores que revertem decisões de instâncias inferiores e anulam provas e processos. Só entre 2003 e 2012 o STF e o STJ anularam 9 operações da Polícia Federal. Enquanto a Suprema Corte americana julga 100 processos por ano, o STF julga 100.000 – o que significa morosidade extrema nos processos sob sua responsabilidade.
A impunidade brasileira é filha do casamento da incompetência com a ideologia. A incompetência sucateou as polícias, que não têm equipamento, treinamento, estrutura ou remuneração compatíveis com sua missão. A ideologia do criminoso vítima da sociedade torna nossas leis cada vez mais permissivas. Desde 1984 todas as mudanças são para reduzir penas e criar benefícios para os criminosos. A tragédia ficou completa quando o Estado entregou aos criminosos o controle dos presídios.
Na contramão de todos os estudos sérios sobre criminalidade, a ideologia livra o criminoso da culpa, que é transferida para a sociedade, para a falta de “educação de qualidade” e até para a má iluminação – mesmo quando milhões de outros brasileiros sofrem dos mesmos problemas sem qualquer envolvimento com o crime.
+ Thiago Ramos Dias: “Brasil falha ao opor incentivos negativos à criminalidade”
O desastre da segurança pública é mais que uma crise: é um projeto político-ideológico. Sair dele requer coragem moral para responsabilizar o criminoso pelo crime, para puni-lo de forma proporcional à gravidade da ofensa e para honrar e apoiar a polícia como um dos fundamentos da sociedade. São três as linhas de ação: reinventar nosso modelo policial, retomar o controle dos presídios e reformar nossa legislação penal – os três “R”s.
A grande maioria dos crimes é cometida por um pequeno número de criminosos, geralmente violentos e armados (como demonstram vários estudos, por exemplo: Ravenous wolves revisited: a systematic review of offending concentration, de Natalie N. Martinez,YongJei
O resto é cortina de fumaça, e uma aposta no caos como arma política.