“Bolsonaro não gosta da imprensa. Acredita, equivocadamente, que as redes sociais são a bola da vez. Não percebe que a agenda pública continua sendo determinada pelas empresas jornalísticas tradicionais. O que você conversa com os amigos, goste ou não, foi sussurrado por uma pauta de jornal. As redes sociais reverberam, multiplicam. Mas o pontapé inicial é dado por um repórter. Bolsonaro precisa conversar com a mídia. As críticas aos governantes, mesmo injustas, fazem parte do jogo. Não é possível recriar uma versão indesejável do “nós contra eles”. Não é bom para o país.
Mas a imprensa, reconheçamos, está uma arara com o estilo agressivo do presidente, sobretudo dos seus filhos. Por isso, tem sido exagerada e superficial no seu olhar crítico a um governo que está dando os primeiros passos. Um governo só pode ser avaliado depois que se constate se as coisas melhoraram ou pioraram em consequência das decisões que pôs em prática. É necessário superar o clima de briga de adolescentes e encontrar o ponto de equilíbrio: respeito e independência.
Governo e imprensa não podem ter uma relação promíscua. É salutar certa tensão entre as instituições. Mas precisam conversar. São peças essenciais da estrutura democrática. Espero que Bolsonaro desça do palanque e assuma o papel de presidente de todos os brasileiros. Espero, também, que nós, jornalistas, deponhamos as armas da militância e façamos jornalismo.
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Jornalismo é a busca do essencial, sem adereços, adjetivos ou adornos. O jornalismo transformador é substantivo. Sua força não está na militância ideológica ou partidária, mas no vigor persuasivo da verdade factual e na integridade da sua opinião. A credibilidade não é fruto de um momento. É o somatório de uma longa e transparente coerência.
A ferramenta de trabalho dos jornalistas é a curiosidade. A dúvida. A interrogação. Há um ceticismo ético, base da boa reportagem investigativa. É a saudável desconfiança que se alimenta de uma paixão: o desejo dominante de descobrir e contar a verdade.
Outra coisa, bem diferente, é o jornalismo de suspeita. O profissional suspicaz não tem “olhos de ver”. Não admite que possam existir decência, retidão, bondade. Tudo passa por um crivo negativo que se traduz numa incapacidade crescente de elogiar o que deu certo. O jornalista não deve ser ingênuo. Mas não precisa ser cínico. Basta ser honrado, trabalhador, independente.
O culto à frivolidade e a submissão à ditadura dos modismos estão na raiz dos problemas. Vivemos sob o domínio do politicamente correto. E o dogma do politicamente correto não deixa saída: de um lado, só há vilões; de outro, só se captam perfis de mocinhos. E sabemos que não é assim. A vida tem matizes.
Registremos, ademais, os perigos do jornalismo de dossiê. Os riscos de instrumentalização da imprensa são evidentes. Por isso, é preciso revalorizar, e muito, as clássicas perguntas que devem ser feitas a qualquer repórter que cumpre pauta investigativa: Checou? Tem provas? A quem interessa essa informação? Trata-se de eficiente terapia no combate ao vírus da leviandade.
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Finalmente, precisamos ter transparência no reconhecimento de nossos equívocos. Uma imprensa ética sabe reconhecer os seus erros. As palavras podem informar corretamente, denunciar situações injustas, cobrar soluções. Mas podem também esquartejar reputações, destruir patrimônios, desinformar. Confessar um erro de português ou uma troca de legendas é fácil; admitir a prática de atitudes de prejulgamento, de manipulação informativa ou de leviandade noticiosa exige coragem moral. Reconhecer o erro, limpa e abertamente, é o pré-requisito da qualidade e, por isso, um dos alicerces da credibilidade.
A força de uma publicação não é fruto do acaso. É uma conquista diária. A credibilidade não combina com a leviandade. Só há uma receita duradoura: ética, profissionalismo e talento. O leitor, cada vez mais crítico e exigente, quer notícia. Quer informação substantiva.
Fonte: “Gazeta do Povo”, 10/02/2019