A impressão que se tem neste momento é que estamos revivendo o “Dia da Marmota”, filme excelente em que Bill Murray sempre acordava e retornava ao ponto de partida, isto é, repetindo as mesmas situações do dia anterior. Nunca saia do lugar, estava sempre no mesmo dia. Parece que estamos vivendo algo parecido no Brasil dos dias de hoje.
Na verdade, vivemos neste terreno minado dos “impasses permanentes” desde o fim do primeiro mandato da “Presidenta” Dilma Roussef, quando eram notórias as “maquiagens fiscais”, “pedaladas” e a total falta de respeito da equipe econômica, liderada por Guido Mantega, por uma gestão fiscal mais responsável ou minimamente coerente. Foi neste período, aliás, que, usando o Tesouro e o BNDES como instrumentos, começou-se a inundar o mercado de crédito, através dos bancos oficiais, mas pouco conseguindo mover a economia, paralisada por crises diárias, principalmente na relação entre Executivo de Dilma e Legislativo de Eduardo Cunha. O crédito jorrou na economia, mas não encontrou demandador dado o momento de incertezas e impasses políticos.
Muitos acham que talvez tenhamos vivido neste período os estertores do velho e ultrapassado “presidencialismo de coalizão ou de cooptação”, embora este tenha conseguido ser ressuscitado nos anos Temer. No governo Bolsonaro, o grande esforço foi acabar mais uma vez com este câncer da sociedade democrática, o “toma lá, dá cá” dos parlamentares.
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Naquela ocasião, já se desenhava um processo de impeachment contra a presidente, dado o abusivo uso das “pedaladas fiscais”, na qual jogavam-se passivos de bancos públicos, carregados de dívidas junto ao Tesouro, para o momento seguinte. Na verdade, este fato, não tolerado pelo TCU e o Congresso, era a “cereja do bolo”. O motivo para a saída da “presidenta” se dava pelo “conjunto da obra”, como, sendo presidente do Conselho da Petrobras, e nada tendo feito contra as várias falcatruas, originárias a “Operação Lava-Jato”. O fato é que havia um esforço concentrado de grande parte do Congresso, da sociedade organizada, diante dos avanços das investigações da Lava-Jato, de tirar o PT do poder, na opinião de muitos, uma verdadeira Organização Criminosa, Orcrim, grande patrocinadora de todas as falcatruas da época.
Bom, tudo isso é agora passado. Não vem ao caso maior aprofundamento.
Retornamos aos tempos atuais e o que se tem é algo parecido. Vem acontecendo de novo um intenso embate entre governo, parte da sociedade, parlamento, inviabilizando a governança do presidente atual, Jair Bolsonaro. Não que ele não seja responsável por muitas das crises, ruídos gerados. Realmente, é um “prato cheio”. Sua falta de habilidade nas articulações políticas, as várias celeumas provocadas por intervenções na Rede Social, mais recentemente, o mal estar do seu guru, Olavo de Carvalho, o bruxo da Virgínia, com boa parte da cúpula militar, núcleo duro do governo, nos coloca em dúvida sobre como isso deve terminar. Afinal, qual a viabilidade do seu governo até o fim, em 2022? Será que sobrevive até lá?
Para piorar, a cada ato desastrado, a cada pisada em falso, grande parte da imprensa, contrariada por perder fatias de publicidade, aproveita para cair em cima. Aquela história do lulo-petismo, do presidente Lula ter “teflon”, nada grudar nele, mesmo com o Mensalão, definitivamente não acontece no ciclo Bolsonaro. Até porque são duas personas públicas opostas. Lula mais habilidoso no trato com os vários atores da sociedade, agradando a muitos, ricos escolhidos e pobres, inclusive, com muitos subsídios; Bolsonaro, ao contrário, se comportando como uma direita raivosa, perseguindo e se vingando de muitos.
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Não vale aqui grandes “juízos de valor”, mas a verdade é que neste clima de beligerância permanente, a indecisão de investimento dos agentes, por ampliar plantas, comprar máquinas novas, etc, só tendo a se aprofundar, com a economia paralisando. Muitos já cogitam o PIB no negativo neste primeiro trimestre, recuando 1%, não crescendo mais do que 1% no ano. O desemprego também volta a crescer, assim como a inflação recrudescendo um pouco.
Há uma crise no cenário e esta muito se assemelha a ocorrida no final do “ciclo dilmista”. A marmota volta a atacar. Continuamos empacados, não saímos do lugar, tudo por questões políticas. Mais uma década perdida, a exemplo dos anos 80, já aparece no radar. E a sociedade cada vez mais cansada, farta desta disputa surda pelo poder numa explosão de vaidades e políticas públicas mal aplicadas.