As eleições municipais do ano que vem serão o primeiro ato da sucessão presidencial em 2022. Enquanto o presidente Jair Bolsonaro tenta fincar estacas do PSL por todo o país, seus principais rivais partem com a vantagem de já contar com estrutura partidária estabelecida.
Os candidatos de Bolsonaro enfrentarão um desafio óbvio à esquerda: o PT. É verdade que o partido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva saiu encolhido dos dois últimos ciclos eleitorais. Nas municipais de 2016, a votação caiu dez pontos percentuais. Em 2018, perdeu pela primeira vez em 16 anos a eleição para presidente.
Mas o PT manteve força em estados do Nordeste e continua a ser o partido com maior capilaridade, mais filiados e aquele com que mais eleitores se identificam espontaneamente, de acordo com a análise dos cientistas políticos David Samuels e Cesar Zucco (leia mais aqui e aqui). A força residual da esquerda será medida pela força do PT.
Leia mais de Helio Gurovitz
O fosso entre Moro e Bolsonaro
Qual o tamanho da crise?
Pânico está ligado à China
A maior incógnita repousa na direita, cuja vitória em 2018 se deu nas costas de um partido nanico, sem estrutura nacional, estreante em governos estaduais, de carona na campanha explosiva de Bolsonaro. Enquanto o PT perdeu três eleições até vencer com Lula em 2002, o PSL chegou ao Planalto e aos corredores do poder em Brasília na primeira tentativa de Bolsonaro.
Para ampliar sua presença nacional, as eleições municipais do ano que vem se tornaram essenciais. Ministros da confiança de Bolsonaro – entre eles Luiz Eduardo Ramos, Jorge Oliveira, Onyx Lorenzoni, Fábio Wajngarten, os generais Augusto Heleno e Rêgo Barros – formam o núcleo que elabora a estratégia eleitoral do PSL.
Parte dessa estratégia se revela no discurso beligerante de Bolsonaro contra ambientalistas, imprensa ou ativistas dos direitos humanos. Outra parte se traduz em apoio financeiro às bases locais. Em emendas parlamentares, o governo já liberou aos municípios verbas que superam os valores registrados nos últimos três anos – R$ 450 milhões, de um total previsto para atingir R$ 1,3 bilhão em 2019.
A ascensão relâmpago do PSL – chegar à Presidência sem passar por prefeituras de capitais ou governos estaduais – também tem um custo. Os principais postos estão ocupados. Mesmo que os partidos políticos tradicionais tenham sofrido um baque nas urnas, não desapareceram, tentam se renovar e oferecerão dificuldades ao ímpeto expansionista.
Nenhum partido demonstra isso tão bem quanto o PSDB, cujo principal bastião, o eleitorado de São Paulo, foi tomado pelo bolsonarismo em 2018. Na esteira da eleição do governador João Doria, até pouco tempo atrás um forasteiro, o partido vive desde então uma crise de identidade que definirá seu futuro.
Depois da humilhante derrota de Geraldo Alckmin, quando o PSDB obteve o menor percentual de votos à Presidência em sua história (5%), Doria lidera o grupo que pretende varrer a tradicional liderança tucana para se apresentar como alternativa a Bolsonaro em 2022.
A primeira medida perspicaz de Doria foi abrir os braços aos ex-bolsonaristas, uma legião de descontentes que se acumula à medida que o governo se revela bem diferente do que imaginavam na campanha. Expulso do PSL, o deputado federal Alexandre Frota se filiou ao PSDB. O ex-ministro Gustavo Bebbiano foi recebido por Doria e estuda filiar-se ao PSDB ou ao DEM.
A segunda medida ainda é uma incógnita: o processo de expulsão do deputado federal Aécio Neves, flagrado na Operação Lava Jato recebendo R$ 2 milhões em espécie do empresário Joesley Batista. O estatuto do partido só determina a expulsão de Aécio se condenado em última instância. Mas a comissão executiva poderá se antecipar ao julgar um processo interno nos próximos dias.
+ Merval Pereira: Nova chance a Moro
A possível expulsão de Aécio, neto de Tancredo Neves associado desde o início ao grupo fundador do partido, seria um marco na história do PSDB. Simbolizaria a transição do antigo partido de alma social-democrata, inspirado nos moldes da esquerda europeia e minado por escândalos de corrupção, para novos tempos sob o comando de Doria.
O objetivo é construir um partido de direita que se apresente como alternativa ao bolsonarismo. Volta e meia vem à tona a ideia de fusão com o DEM. Embora enfrente dificuldades regionais específicas, não é uma hipótese que possa ser descartada.
Dois movimentos deverão, portanto, ser observados nos preparativos e na campanha às eleições municipais. Primeiro, a tentativa petista de recuperar o terreno perdido em 2016. Segundo, o embate entre as forças de Bolsonaro e de Doria. Do resultado desse confronto, dependerá o quadro eleitoral de 2022.
Fonte: “G1”, 20/08/2019