Escrevo de Londres, onde ocorre uma grande feira de inovação em educação, com a participação de empresas consolidadas e startups do mundo todo, oferecendo soluções para apoiar a aprendizagem da educação infantil ao ensino superior —a Bett Show. Os produtos envolvem gamificação da educação básica, formação continuada de professores usando EaD, ferramentas para avaliação de aprendizagem e uso de inteligência artificial para viabilizar a personalização do processo de ensino.
Ao percorrer os estandes e ouvir idealizadores de soluções, consegue-se vislumbrar tendências em educação, especialmente para os países que já resolveram seus problemas de acesso e qualidade.
Mas não há como olhar para essas múltiplas alternativas tecnológicas sem ser tomado de ceticismo sobre sua utilidade para educar crianças que, no nosso caso, não conseguem sequer se alfabetizar ao final do 3º ano. Por outro lado, surge a dúvida se essas soluções vão, no futuro, tender a substituir os professores.
Nem uma coisa nem outra. Sim, não estamos desenvolvendo, nos nossos alunos, sequer as competências básicas como literacia e numeracia, mas não temos como limitar o processo de ensino ao que já deveríamos estar fazendo bem para, só então, preparar os alunos para o século em que vivem. O mundo não irá esperar por nós.
Mais de Claudia Costin
Diplomacia ou guerra?
Aprender com o que já fazemos certo
Formar leitores para o século 21
Precisamos desenvolver, com apoio de tecnologia e achados científicos, as competências cognitivas, socioemocionais e digitais dos jovens de forma a nos assegurar que o país construa um processo de desenvolvimento que inclua todos, face à atual onda de substituição acelerada de trabalho humano por inteligência artificial. E a educação será chave para isso, desde que vá na direção correta.
O outro risco, o de tornar os professores supérfluos, não tem sido confirmado pelos estudos. Ao contrário, mesmo com a intensa transição demográfica que vivemos, o que os especialistas têm mostrado é que há uma grande escassez de docentes para realizar um trabalho sólido e consistente de preparação de crianças e jovens para etapas subsequentes de escolaridade, para o mundo do trabalho e para a vida em sociedade.
A inteligência artificial não tem como eliminar postos de trabalho de professores, mas pode ser-lhes de grande valia se, de fato, prepararmos os mestres para trabalhar com informações sobre o que aprende cada aluno, de forma a apoiá-los na descoberta de estratégias mais efetivas de ensino e permitir-lhes que identifiquem e removam déficits de aprendizagem. Ainda não inventaram nada melhor para educar crianças e adolescentes que um bom professor!
Fonte: “Folha de São Paulo”, 24/1/2020
Foto: Getty Images/iStockphoto