O mundo globalizado traz consigo doenças exponenciais. O risco era conhecido, mas a capacidade estrutural das nações, não. Constatada a ameaça, medidas de urgência são implementadas, algumas das quais extremamente severas e de altíssimo custo econômico. Infelizmente, diante da ofensiva pandêmica, não existe solução fácil, simples ou barata. Na balança dos interesses em jogo, entre prejuízos patrimoniais e a proteção humana, cabe aos governos a máxima tutela da vida em todas as suas formas possíveis. Tal fato, frisa-se, não significa que a economia deva ser menosprezada, pois a estratégia a ser adotada é de dois tempos.
Sim, a imposição de isolamento social é uma medida drástica. No entanto, enquanto a ciência não desenvolver um medicamento eficaz, o temporário distanciamento interpessoal tem se revelado a melhor forma de contenção epidemiológica. Concordo que não é fácil; sou filho de uma mãe idosa com doença degenerativa, a exigir cuidados especiais. Embora o amor exija proximidade e carinho presencial, posso acabar sendo o agente transmissor de um vírus letal. No drama do presente, temos, então, que fazer escolhas difíceis à luz de circunstâncias extraordinárias.
No caso brasileiro, o sistema de saúde já opera em carga máxima na normalidade dos dias. Ou seja, temos pouquíssima capacidade ociosa em nossos hospitais e o advento exponencial de uma patologia mortal poderá levar o sistema – público e privado – ao colapso absoluto. Já há falta de EPI aos profissionais da saúde e o mercado de respiradores está exaurido e com práticas pouco usuais. A doença já chega a hospitais da rede pública, indicando que estamos entrando em curva de contaminação geométrica.
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A hora, portanto, exige união e solidariedade. Além de medidas de higiene pessoal, teremos que ser proativos no enfrentamento da pandemia: ao invés de esperar a vinda pacientes aos hospitais, teremos que ir até os doentes. Ou seja, temos que formar grupos de voluntários que, somados aos profissionais da saúde, façam visitas domiciliares e levem tratamento e conforto às pessoas. Ao invés de uma postura de aguardo, precisamos inverter a dinâmica, nos antecipar aos acontecimentos, criando soluções que resguardem a capacidade de atendimento eficaz dos hospitais brasileiros.
Por fim, quanto à economia, o afastamento social é a fase 1; na descensão do ciclo viral, retomar-se-á uma abertura gradual, isolando apenas doentes e vulneráveis. Temos que pensar e implementar planos de socorro creditício à população mais carente, viabilizando a manutenção do consumo e comércio locais. Ato contínuo, precisaremos alongar dívidas e conceder respaldo financeiro às empresas, garantindo-se, ainda, a solvência e vitalidade do sistema bancário, a juros mais baratos.
A situação é gravíssima e nos impõe desafios impensáveis. Mas, no enfrentamento da dor, encontraremos a força superior que nos fará vencer.