A greve dos caminhoneiros começou com amplo apoio da população. No primeiro momento, os brasileiros se solidarizaram com os caminhoneiros. Na visão da maioria, suas reivindicações eram justas e pertinentes. Afinal, a crise que atingiu o Brasil foi brutal e cobrou um preço exorbitante, até agora rateado por todos, com alguns pagando mais do que outros.
Os caminhoneiros estão certos quando afirmam que não têm condições de repassar os aumentos do diesel para o preço do frete. Que a margem de manobra é mínima e que não tem sentido trabalharem para ter prejuízo. Do outro lado, a Petrobrás também está certa. Uma empresa como ela não é uma entidade assistencial e, portanto, não tem sentido assumir a diferença do custo dos combustíveis por causa do aumento do preço do petróleo nos últimos meses.
Não cabe aqui entrar nos detalhes do aumento do preço dos combustíveis, nem na impossibilidade dos caminhoneiros repassarem o aumento de seus custos. O que está sendo analisado são os prejuízos resultantes da greve e quem arca com a conta.
Leia mais de Antonio P. Mendonça
Uma regulamentação importante
Seguro, conciliação, mediação e arbitragem
A judicialização dos planos de saúde
O agronegócio foi violentamente afetado em todas as suas áreas. Milhões de frangos morreram, centenas de milhares de litros de leite foram jogados fora, frutas e verduras apodreceram, soja deixou de ser transportada, bois não foram abatidos e por aí vamos, numa extensa lista cujos prejuízos, em sua maioria, não serão ressarcidos.
Mas não foi apenas a agricultura que foi afetada. A indústria automobilística parou, a produção de açúcar e álcool foi suspensa por falta de óleo diesel nas usinas, o comércio em geral perdeu bilhões de reais pela queda do movimento, o País quase foi estrangulado pela falta de combustíveis nos postos, enfim, só não ficou pior porque, no curto espaço de tempo em que as coisas aconteceram, não tinha como piorar ainda mais.
O governo falhou. A sede de arrecadação, a falta de sensibilidade, a truculência de nossas autoridades não permitiram uma correta avaliação de um quadro claramente exposto pelos próprios caminhoneiros por meio de correspondências encaminhadas a diferentes autoridades, incluindo o gabinete da Presidência da República.
Quando começou a faltar combustível nos tanques dos veículos, a população passou a rever o apoio aos grevistas. Mas era tarde, os prejuízos já estavam contabilizados.
Será que em alguma das situações decorrentes da greve haveria possibilidade de algum tipo de seguro ser acionado para minimizar os prejuízos? A resposta é sim. Determinadas situações poderiam ser seguradas, o que minimizaria os prejuízos, pelo menos em relação a algumas das perdas.
O primeiro seguro a ser invocado, até pela característica do movimento, que fechou rodovias em todo o País, é o seguro de responsabilidade civil do transportador de carga. Este seguro não indenizaria. Sua cobertura é para danos à carga decorrentes de acidentes envolvendo o veículo transportador e não foi isso o que aconteceu.
O segundo seguro é o de transporte rodoviário de carga. Esta apólice deve ser contratada pelo embarcador ou pelo proprietário da carga e, nos casos de empresas, é obrigatória. O seguro de transporte, desde que contratadas as cláusulas específicas para danos decorrentes de greve ou atos de vandalismo, indenizaria os danos sofridos pelas mercadorias embarcadas nos caminhões ou durante o processo de transporte. Além disso, os seguros das grandes empresas que tivessem garantia para interrupção de produção também indenizariam as perdas decorrentes da greve, desde que em consequência da falta de material para o seu funcionamento.
O seguro de lucros cessantes também poderia cobrir, mas a indenização dos prejuízos poderia não acontecer porque o conceito de lucros cessantes não se confunde com a paralisação ou a interrupção temporária das vendas. O que ele leva em conta é quanto a empresa efetivamente deixou de lucrar por causa do evento coberto.
Apesar de existirem seguros para o caso, as indenizações cobrirão parte ínfima dos prejuízos. A verdade é que o brasileiro não contrata seguro. E aí o prejuízo é dele.
Fonte: “Estadão”, 04/06/2018