Depois da segunda eleição neste ano em Israel, a formação de um novo governo ainda é incerta. Com 92% dos votos apurados até o final da manhã de hoje, nenhum dos principais partidos tinha garantia da maioria necessária para governar: 61 das 120 cadeiras no Knesset, o Parlamento israelense.
Os resultados oficiais finais são esperados para a tarde de amanhã. De acordo com os provisórios divulgados pelo jornal Haaretz, tanto o Likud, do premiê Bibi Netanyahu, quanto o Azul e Branco, do ex-general Benny Gantz, somavam 32 cadeiras. O terceiro partido mais votado era a Lista Conjunta de quatro partidos árabes, com 12 cadeiras.
Em seguida, com 9, vinham o religioso Shas e o Israel Nossa Casa (do ex-ministro da Defesa Avigdor Lieberman), ambos com 9; o religioso União do Judaísmo da Torá, com 8; e o Direita (da ministra da Justiça, Ayelet Shaked), com 7. À esquerda, o Partido Trabalhista obtinha 6, e o Campo Democrático (do ex-premiê Ehud Barak), 5. O partido de extrema-direita Poder Judaico não superava a barreira de 3,25% dos votos, necessária para entrar no Knesset.
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Todos esses números ainda podem mudar, mas não de forma dramática. Nem Bibi nem Gantz têm um caminho óbvio para formar governo. A coalizão de Bibi, com os partidos religiosos e o Direita, somava 56 cadeiras no máximo. A de Gantz, com os dois partidos de esquerda, 43. Nem as 9 do Israel Nossa Casa, de Lieberman, bastariam para ele alcançar a maioria.
Lieberman, que rompeu com Bibi depois da eleição de abril para forçar as novas eleições, defende um governo de união nacional, incluindo Likud e Azul e Branco. É um cenário possível, mas envolveria uma negociação delicada entre os maiores rivais.
Já houve vários outros governos de união nacional em Israel, com coalizões entre partidos de posições ideológicas quando não antagônicas, no mínimo distantes. O último foi a aliança que sustentou o ex-premiê Ehud Olmert, que reunia trabalhistas ao conservador Kadima.
No campo econômico, em política externa e na questão palestina, há bem menos antagonismo entre o Likud atual e o Azul e Branco do que havia nas coalizões de Ariel Sharon em 2001 (que também incluiu os trabalhistas) ou na dobradinha de Shimon Peres e Yitzhak Shamir, entre 1984 e 1988. Nenhuma delas, claro, era assombrada pelo fator Bibi.
O atual premiê recorreu às eleições no final do ano passado para tentar aprovar no Knesset leis que o preservem de indiciamento nos três casos de corrupção em que foi denunciado (leia mais aqui). Quase deu certo em abril, mas Lieberman estragou seus planos ao impor condições para participar do governo inaceitáveis aos partidos religiosos (a obrigação de estudantes de escolas rabínicas prestarem serviço militar).
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Para lideranças rivais no Likud, seria mais confortável esquecer as exigências dos ultraortodoxos, se livrar de Bibi e fechar uma aliança com Gantz e Lieberman. Mas como? Bibi é o legítimo líder do partido e afirmou ontem que tentará formar um novo governo de caráter “sionista”, um ataque direto ao flerte entre Gantz e os partidos árabes (um dos quais é contra o Estado de Israel em sua atual forma).
Gantz também afirmou ser a favor do governo de união e disse ter começado a negociá-lo. Evitou falar em aliança que incluísse partidos árabes. Em toda a história de Israel, os árabes sempre votaram e foram eleitos, mas jamais fizeram parte de nenhum governo. Se houver uma aliança entre Likud e Azul e Branco, pela primeira vez ocupariam a liderança a oposição, como maior partido fora do governo.
O maior empecilho ao governo de união é sem dúvida o próprio Bibi. Nem Gantz nem Lieberman o aceitariam na coalizão. Ele, em contrapartida, não toparia uma posição secundária, nem cederia na legislação para se proteger do indiciamento. Como o Likud não foi capaz de produzir outro líder alternativo – os mais próximos foram o ex-ministro Gideon Saar e o parlamentar Yuli Edelstein –, mesmo que acabe derrotado ao final da apuração, Bibi continuará a estorvar a formação do novo governo.
Fonte: “G1”, 18/09/2019