Não. Não é justo, nem democrático censurar a Internet como foi proposto em emenda incluída, sem muito alarde, no texto da Reforma Política aprovado praticamente em sessão relâmpago pelo Congresso Nacional. A sorte é que, após enorme repercussão negativa em todos os meios de comunicação, o autor da ideia voltou atrás, admitindo que sua intenção jamais foi censurar alguém e sim combater práticas nocivas nas redes sociais.
Claro, ninguém de bom senso é favorável à proliferação de mensagens que fortaleçam o discurso de ódio, a disseminação de informações falsas ou ofensas, mas daí a tratar isso como justificativa para a censura prévia vai uma grande distância. O Brasil não precisa de censura, precisa, sim, de mais e mais liberdade.
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Primeiro, porque a liberdade de expressão e de imprensa, cláusulas pétreas na Constituição de 1988, são vitais para a democracia. Sem liberdade não há democracia. Nem direito. Por isso, qualquer ato de censura, se inescapável, precisa ser a posteriori, jamais prévio. Essa é a essência do liberalismo político.
Em segundo lugar, faz cerca de 30 anos que deixamos para trás uma triste experiência de censura e não podemos permitir retrocessos. Afinal, o que é um discurso de ódio? O que é de fato uma notícia falsa? O que é uma ofensa? Quem pode atirar a primeira pedra? Quem vai criar a regra ou impor um limite?
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O que chama a atenção em propostas como esta é ainda a ingenuidade de certos agentes públicos que acreditam que leis restritivas irão combater os excessos praticados nos ambientes digitais, mas não levam em conta o risco autoritário que se esconde nos meandros de textos subjetivos e recheados de boas intenções.
O combate às práticas ilegais na Internet deve ser intensificado sim, mas não há necessidade de inventar a roda. O Brasil já possui um arcabouço legal que estabelece limites e pune aqueles que exercem tais práticas. Dispomos de regras claras como o Marco Civil da Internet, considerado hoje uma referência mundial. Tanto pelo seu ineditismo, como pela capacidade de lidar com os novos tempos sem o recurso (fácil e danoso) da censura.
No caso específico da emenda proposta, a tentativa de censura prévia a aplicativos ou redes sociais acabou tendo dois aspectos positivos. Diante das pressões de opinião pública, o próprio autor da emenda solicitou ao presidente Temer que a vetasse, no que foi prontamente atendido. Em paralelo, as mobilizações foram tantas que ficou mais uma vez demonstrado: o país não aceita recuos em relação à liberdade de expressão.
A lição que fica é que não podemos baixar a guarda. Como disse o estadista Abraham Lincoln e, também, a filósofa Simone de Beauvoir, as ameaças à liberdade nunca desaparecem por completo. Estão sempre de volta, por mais estáveis que parecem os regimes democráticos. No Brasil não é diferente. O dado positivo é que a sociedade, em sua diversidade, manifestou-se em defesa da liberdade.
Como diria o poeta Castro Alves, “liberdade, liberdade, abra as asas sobre nós”.
Fonte: “Dissenso”, 16/10/2017
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