O presidente Bolsonaro sugeriu, ontem, que seria preciso rever o teto de gastos, aludindo particularmente às dificuldades das Forças Armadas de gerir orçamentos reduzidos. Hoje, depois de falar com membros da equipe econômica, ele mudou de opinião. Afirmou enfaticamente que o teto será mantido e apontou os riscos de sua flexibilização.
Uma eventual flexibilização do teto de gastos neste momento teria efeitos devastadores sobre a confiança no país. Uma correspondente fuga de capitais traria de volta os riscos de inflação alta e sem controle, pois o dólar dispararia sua cotação em reais.
Vale relembrar as razões do teto, fixado pela emenda constitucional n 95, de 15/12/2016. Era preciso dar um basta ao crescimento das despesas públicas federais, que se expandiam desde a década de 90 a um ritmo médio anual de 6% ao ano.
O país estava na rota da insolvência fiscal. Em algum momento o governo perderia a capacidade de pagar juros e amortizações da dívida, que seria monetizada, isto, seu financiamento aconteceria mediante emissão de moeda. A consequência seria o retorno ao inferno inflacionário de que nos livramos com o Plano Real.
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A EC 95 estabelece um poderoso conjunto de medidas para a hipótese de descumprimento do déficit, quais sejam a vedação à concessão de aumentos para servidores públicos civis e militares, à reestruturação de carreiras, a novas admissões de pessoal, à realização de concursos, à criação de despesas obrigatórias e à adoção de medidas que impliquem elevação de gastos permanentes.
As demandas por flexibilização do teto costumam centrar-se na exclusão dos investimentos públicos. Na verdade, em um Congresso suscetível de pressões corporativistas e setoriais, a proposta tenderia a abrir uma torneira de outras exclusões. Por que não os gastos do Judiciário? Por que não elevar os recursos para as regiões menos desenvolvidas? Por que não criar programas de geração de empregos. E por aí iria.
A desidratação do teto, possível diante de um governo ausente de adequada articulação política e de força para barrar a avalanche de pedidos, inclusive dos próprios ministérios, colocaria o Brasil de volta ao risco de colapso fiscal. A confiança duramente conquistada perante investidores nacionais e estrangeiros iria pelo ralo. Os pobres pagariam a conta do correspondente desarranjo, principalmente por causa da inflação mais alta.
Um de nossos mais competentes especialistas em finanças públicas, Fabio Giambiagi, defendeu recentemente a flexibilização do teto, sujeita a uma séria de restrições e mesmo assim para vigorar a partir de 2023. Nessa época, a consolidação da reforma da Previdência e o avanço na agenda de reformas do governo poderiam justificar uma cuidadosa revisão do teto. Não agora. Seria um desastre.
Fonte: “Veja”, 5/9/2019