Cem pessoas sentam-se em um círculo, cada uma com seu bolso cheio de centavos. Um político caminha por fora do círculo, pegando um centavo de cada pessoa. Ninguém se importa; quem se importa com um centavo?
Quando o político dá toda a volta em torno do círculo, joga 50 centavos para uma pessoa, que se sente cheia de alegria com a sorte inesperada.
O processo é repetido. Um centavo é novamente recolhido de cada uma das 100 pessoas e, ao final, 50 centavos são entregues para outra pessoa.
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E assim vai, até que cada uma das cem pessoas tenha recebido 50 centavos.
Após cem voltas, cada indivíduo está 100 centavos mais pobre e 50 centavos mais rico. E todos estão felizes.
Essa história acima foi criada por David Friedman, e explica não apenas por que os brasileiros gostam de programas governamentais, como também por que eles torcem o nariz para privatizações.
Se alguém perguntasse aos participantes do jogo se eles defenderiam o fim do sorteio dos 50 centavos, muitos diriam que não, claro que não.
Seria injusto acabar com o jogo que deixa tanta gente feliz e que “enriquece” cada uma em 50 centavos (os 100 centavos perdidos paulatinamente não são notados; os 50 centavos ganhos de uma só vez são perfeitamente percebidos).
As universidades públicas, por exemplo, representam os ganhos de 50 centavos. Quem entra em uma universidade pública ganhou os 50 centavos do exemplo acima. O curso de um aluno na Unicamp pode custar 79 anos de impostos de um trabalhador que ganha salário mínimo. Mas ninguém vê esse custo — ele é disperso entre todos, enquanto a universidade gratuita é concreta, grandiosa e sem mensalidade.
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É claro que, se um jornal sugerir a venda das universidades, como fez “O Globo” há algum tempo, as pessoas reagirão com histeria.
Uma enquete do Instituto Paraná Pesquisas mostrou que 61% dos brasileiros não querem que o governo privatize os Correios, os bancos públicos ou a Petrobras.
Estatais (e o serviço público em geral) têm benefícios concentrados e aparentes, enquanto os custos são ocultos e dispersos entre os cidadãos. Você não sente pagar, mas sabe muito bem quando está recebendo alguma coisa que parece de graça. Por que ser a favor de empresas privadas se elas raramente dão coisas gratuitamente?
Trens e aviões
Uma recente reportagem do “Jornal do Commercio” afirmou que a malha de trens de passageiros no Nordeste sofreu desmonte depois que as ferrovias foram privatizadas.
Eu tive uma impressão parecida quando a RFFSA foi privatizada no Paraná. Na época da “rede” estatal, pagávamos uma ninharia para descer a Serra de trem até Paranaguá; depois da venda, o preço explodiu. Maldita privatização!
A mesma reação tiveram os espanhóis diante da privatização da Iberia, a empresa de aviação. “Quando era estatal, era uma delícia”, me contou uma amiga espanhola tempos atrás. “Custava pouco e tinha espumante liberado pra todo mundo.” Depois da privatização, fim da mordomia.
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O que eu, os universitários, minha amiga espanhola e os passageiros de trens do Nordeste não percebíamos é o custo do serviço público. Todos pagávamos para manter linhas de trem deficitárias, obras superfaturadas, universidades em greve e trens e aviões sucateados. Mas esse custo chegava em forma de impostos, dívida pública e inflação, que afetavam majoritariamente os mais pobres, enquanto os mais ricos ainda auferiam alguns benefícios.
E, ironicamente, é exatamente em nome dos mais pobres que muitos defendem a existência de estatais.
Os serviços “grátis” criaram a hiperinflação dos anos 1980 e tornaram nossos pais incapazes de pagar a faculdade dos filhos, mas era difícil relacionar a ferrovia estatal ou a universidade pública à crise do país.
A privatização ajudou a diminuir o rombo das contas públicas e, com isso, ajudou no fim da hiperinflação. Mas tornou aparentes custos que antes eram invisíveis, enquanto a carga tributária só aumentou.
Não é à toa que tantos brasileiros ainda hoje rejeitam vender as estatais.
Fonte: “Mises Brasil”, 19/07/2018