Quatro semanas antes da eleição presidencial mais imprevisível dos últimos tempos surgiu o imponderável. O atentado contra Bolsonaro na mineira Juiz de Fora alterou a dinâmica do pleito e reorganiza a estratégia de todos os candidatos ao Planalto. Estamos diante de uma eleição nova, entretanto, com os mesmos favoritos.
Aquele atingido mais diretamente pelo ocorrido foi Alckmin. Sua campanha trabalhava diante de uma estratégia simples, que era a desconstrução de Bolsonaro. Impedido de atacar o concorrente, o tucano surge para as semanas finais de campanha sem estratégia e um latifúndio de propaganda eleitoral. O tom de seus programas pós-atentado mudou, resta saber se encontrará um rumo que possa impulsionar seu nome para o segundo turno. Uma tarefa praticamente impossível.
Haddad, ao contrário, tem pista livre para crescer na carona de Lula. Nesta semana começa de verdade a campanha para o PT. Veremos peças de Lula com apoio explícito a Haddad e Manuela e a chapa deve ganhar tração além do esperado, assegurando a segunda vaga. A equação de Haddad é simples: apoio de Lula, fundo eleitoral de 212 milhões, apoio maciço do Nordeste, rejeição ao governo Temer. Tudo isso diante da mais competente equipe de comunicação da política brasileira.
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Isto explica porque Ciro e Marina devem ficar pelo caminho. Ao canalizar os votos da esquerda, Haddad deve também esvaziar as candidaturas dos seus concorrentes diretos. Hoje, o petista já chega aos 13% quando vinculado ao apoio de Lula. Pode chegar facilmente aos 20%. Alckmin segue na disputa pela mesma vaga e ao invés de mirar no eleitor de Bolsonaro, que jamais trocaria o capitão pelo tucano, deve buscar votos úteis nas hostes de Álvaro Dias, Meirelles e Amoedo para tentar ultrapassar os petistas. No duelo entre eles, entretanto, não há dúvida que Haddad e Manuela passam a imagem de uma chapa com mais apelo e vigor do que Alckmin e Ana Amélia. Na soma, petistas tem vantagem sobre tucanos.
A facada desferida contra Bolsonaro teria dois desfechos possíveis. Restou apenas um deles, aquele em que o candidato sobrevive, ou seja, o pior cenário para aqueles que gostariam de ver o capitão longe da disputa, pois agora ele ressurge com ainda mais força. Fora dos atos de campanha no primeiro turno, não deve participar de debates ou comícios. Enquanto convalescer, não poderá ser vítima dos ataques do opositores, sob pena de seus números crescerem ainda mais e a rejeição daqueles que o atacarem chegar nas alturas. Diante de um eleitorado fiel, sua presença no segundo turno é praticamente certa.
Fato é que a dinâmica da campanha mudou no sentido de acelerar um cenário que estava sendo desenhado. Bolsonaro consolidado no primeiro lugar e uma disputa pela segunda vaga, com larga vantagem para Haddad. Alckmin, que ainda sonha em atacar Bolsonaro para chegar na fase final, parece cada vez mais longe do seu objetivo. Nesta nova campanha, um duelo real entre esquerda e direita parece surgir com mais nitidez no horizonte da política brasileira.
Fonte: “O Tempo”, 10/09/2018