O “Jornal Nacional” apresentou ontem uma excelente matéria sobre o novo código comercial brasileiro, que está em discussão no Congresso. Vale a pena assistir, embora tudo possa ser resumido numa só frase: “O texto que está no Senado tem 1.103 artigos e o da Câmara, 670.”
É óbvio que se trata de um enorme exagero. Essa volúpia legislativa, herdada da tradição positivista, que pretende que a lei cubra toda e qualquer possibilidade ou circunstância, é típica da tradição política brasileira. Como bem lembrou um dos entrevistados: “O novo código cria regras onde elas não são necessárias. E cria duplicidade de regras em alguns casos. Nós não precisamos dessas grandes reformas que tentam resolver todos os problemas, ignorando a complexidade deles, ignorando que tem muita coisa diferente e que uma única solução não resolve tudo”.
Segundo a matéria, desde a promulgação da Constituição de 1988, já foram editadas mais de 5,5 milhões de normas, o que torna praticamente impossível aos brasileiros cumpri-las em sua totalidade, bem como às autoridades responsáveis fiscalizar o seu cumprimento. É tanta lei e regulamento infra-legal que não seria exagero dizer que todos os brasileiros adultos, sem exceção, já violaram alguma norma municipal, estadual ou federal em algum momento.
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A edição do novo Código Comercial parece ser mais uma tentativa, entre tantas ao longo da história, em que leis elaboradas com as melhores das intenções acabarão gerando incentivos perversos e consequências imprevistas, não raro na direção oposta à planejada.
Como já escrevi em outro lugar, embora a necessidade de desregulamentação e simplificação legislativa seja urgente, medidas nesse sentido são raríssimas em Pindorama. Não por acaso, o Brasil é um dos últimos colocados no ranking de competitividade global. Além das deficiências educacionais, de impostos altíssimos, dos baixos índices de poupança e investimentos, de uma infraestrutura capenga e cara, o país é massacrado também por um elevadíssimo custo de transação – custos indiretos, não relacionados com a atividade fim das empresas, como despesas com advogados, contadores, assessoria fiscal, etc.
Alguns dirão que, à medida que a sociedade cresce, as normas devem se multiplicar. Ledo engano. Quanto mais complexas forem as sociedades, mais as leis devem ser poucas e simples. Como ensinou Hayek, os legisladores não têm como conhecer nem um milionésimo do cotidiano de uma sociedade complexa, sendo-lhes impossível obter as informações de que necessitariam para planejá-la e direcioná-la consistentemente. Na verdade, os indivíduos que atuam em nome do Estado não conhecem nem uma ínfima parcela das pessoas, dos fatos e das circunstâncias que envolvem cada relação social ou transação econômica.
O antigo filósofo chinês Lao Tsu já dizia que quanto mais restrições artificiais impuserem ao povo, mais ele será empobrecido; e quanto mais leis e regulamentos houver, mais se estimularão as fraudes, os roubos e outros ilícitos.
Ao inibir a livre iniciativa com excesso de regulamentos e leis, o máximo que suas excelências conseguirão é frear o desenvolvimento. Aliás, não é outra a razão por que as experiências de planificação e dirigismo estatal ao redor do mundo redundaram sempre em formidáveis fracassos.
Fonte: “Instituto Liberal”, 27/02/2018