A má qualidade da infraestrutura de logística terrestre e aquaviária é um dos fatores que mais penaliza nossa competitividade. No Relatório de Competitividade Global, o Brasil ocupa a 106a, 103a e 88a posição, entre 137 países, em relação à qualidade das infraestruturas portuária, rodoviária e ferroviária, respectivamente. A razão é simples: investimos pouco nesses setores e com isso sua capacidade cresce menos que o PIB, gerando congestionamentos que reduzem a produtividade do capital e dos trabalhadores brasileiros. E as consequências não são só econômicas: o Brasil é campeão mundial de mortes em acidentes rodoviários: em 2013, 46.935 mortes.
É muito bem-vindo, portanto, o Plano Nacional de Logística (PNL) que a Empresa de Planejamento e Logística (EPL) colocou para consulta pública semana passada (ver https://bit.ly/2GjbnwM). O plano projeta a demanda futura por transporte de carga e com isso identifica os principais gargalos e como superá-los de forma a minimizar os custos de transporte e a emissão de CO2, o principal gás causador do efeito estufa.
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Trata-se de um exercício não trivial. Pelas minhas contas, projetou-se a demanda por transporte em quase 333 mil pares origem-destino, para quatro tipos de carga diferentes (cargas gerais e granéis sólidos agrícolas, não agrícolas e líquidos). Projetou-se a demanda em 2025, usando previsões macroeconômicas, os padrões de transporte atual e a estrutura de produção e absorção local. A partir dos custos para cada par origem-destino para diferentes modais e tipos de carga, essa demanda por transporte foi então alocada aos vários modais para minimizar os custos de transporte e a emissão de CO2.
O PNL considerou três cenários para a disponibilidade de capacidade de transporte. O primeiro assume que estarão disponíveis em 2025 a atual rede de transporte e as infraestruturas em construção cuja conclusão das obras é esperada até o final de 2020. São basicamente seis rodovias na Bahia, Minas Gerais e Pará, e na duplicação da Estrada de Ferro Carajás. O segundo cenário adiciona a essa malha empreendimentos do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI); em especial, a construção, duplicação, adequação e manutenção de 7.756 quilômetros de rodovias e 3.223 quilômetros de ferrovias.
Por fim, o terceiro cenário considera, além da infraestrutura constante do segundo cenário, os investimentos de expansão e adequação da capacidade das ferrovias privatizadas nos anos 1990, a serem realizados no âmbito da prorrogação antecipada dessas concessões.
A principal conclusão que se tira desses cenários é a essencialidade dos investimentos de ampliação de capacidade a serem realizados nas ferrovias já existentes, como parte da prorrogação antecipada dessas concessões. Assim, no terceiro cenário, que o relatório enfatiza ser o mais favorável, o custo total de transporte em 2025 é de R$ 287,3 bilhões e a emissão de CO2 de 114,7 milhões de toneladas. No segundo cenário, em que não há os investimentos com a prorrogação antecipada, os custos de transporte e as emissões de CO2 são 12% e 10% maiores, respectivamente (mais R$ 32,5 bilhões e 11,6 milhões de toneladas). E, no primeiro cenário, sem prorrogação antecipada ou novos empreendimentos do PPI, os custos e as emissões seriam 19% e 17% maiores (mais R$ 54,7 bilhões e 19,1 milhões de toneladas).
Esse estudo inaugura uma abordagem mais racional para o planejamento logístico nacional, dando bases mais concretas para decisões regulatórias e de seleção de projetos. Nesse sentido, faria duas sugestões para a versão a ser produzida após o período de consulta. A primeira é que, além dos custos de transporte e das emissões de CO2, se considere também o impacto em termos do número de mortes resultantes de acidentes na malha de transporte.
A segunda é que o PNL dê um alerta mais forte da urgência das iniciativas constantes no terceiro cenário, em especial na expansão da malha ferroviária já concessionada (sobre isso ver entrevista do presidente da EPL a Daniel Rittner no Valor). Ainda que com projeções relativamente conservadoras de aumento da demanda por transporte – cerca de 2,4% ao ano – o Plano mostra que os gargalos de transporte tendem a aumentar rapidamente sem esses investimentos. E isso considerando um cenário para daqui a sete anos! Esse é um prazo não muito longo quando se pensa em investimentos em infraestrutura. As decisões precisam ser tomadas com presteza.
Fonte: “Correio Braziliense”, 28/03/2018