Decisão da Justiça de limitar reajuste de plano de saúde em 5,72% dificulta a contratação de novos planos individuais, pois as empresas do setor não querem operar no vermelho
Um juiz federal de São Paulo, liminarmente, limitou o aumento dos planos de saúde privados individuais em 5,72%. Não compete ao Judiciário determinar aumentos de preços. A decisão é, no mínimo, equivocada, mas mostra o grau de ativismo político que permeia as decisões de parte dos integrantes do Judiciário. Não há dúvida de que é uma minoria, mas suas decisões, em todos os campos, têm o condão de gerar enorme insegurança jurídica, além de levantar dúvidas sobre a atuação de órgãos encarregados da normatização e fiscalização de importantes setores econômicos.
Os planos de saúde privados não precisam de outros inimigos além da própria lei que os regulamenta e da demagogia barata de deputados e senadores interessados em ficar bem na foto. Invariavelmente vendidos como inimigos da população, paradoxalmente, os planos de saúde privados são o terceiro sonho de consumo do cidadão brasileiro.
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Quer dizer, os brasileiros querem os planos de saúde privados os atendendo, mas, de outro lado, os brasileiros não têm recursos para custear seus planos no nível que gostariam de ser atendidos. Então, por conta de diferentes razões que não vem ao caso serem analisadas, gente que não entende muito bem como os planos funcionam, até porque não têm a menor noção do que seja mutualismo, decide que eles não podem custar mais do que tanto, ou devem cobrir isso e aquilo.
Para certas pessoas bem intencionadas, mas que não fazem conta, tanto faz quanto custa as operadoras oferecerem tudo o que eles mandam, quanto as pessoas podem pagar e, mais grave, saber que no final a conta pode não fechar. O importante é ficar bem com o povo, ter os quinze minutos de glória e se sentir a reencarnação de Ivanhoé com sua espada flamejante, lutando para proteger os pobres e oprimidos.
Até agora não foi dada nenhuma liminar limitando o preço de um Rolls-Royce novo ao de uma Brasília 1976. Seria um absurdo de tal ordem que não passa pela cabeça de ninguém uma determinação desta natureza. Todavia, parece que o magistrado que limitou o aumento dos planos de saúde individuais não se deu conta de que ele fez exatamente isto.
Não há relação entre a inflação da moeda e os preços da saúde. Especialmente num país como o Brasil, onde mais de 80% dos insumos e 90% dos equipamentos destinados ao atendimento médico-hospitalar são importados. A mera variação do dólar nos últimos 12 meses seria suficiente para que o reajuste fosse maior do que os 5,72% autorizados pelo magistrado.
Aliás, aqui caberia perguntar onde o juiz conseguiu este índice e porque não 5,5% ou 6%. Mas seria sair do tema, que é muito sério e não permite divagações.
Ao determinar o índice do reajuste, a liminar colocou em xeque e desrespeitou a atuação da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), que é a agência oficial encarregada dos planos de saúde privados. Ou seja, ela desconsiderou a regra da divisão dos Poderes, que é pedra angular da Constituição brasileira e investiu o Judiciário de um poder que, constitucionalmente, ele não tem.
Não compete ao Judiciário substituir o Executivo. Cada um tem suas atribuições e, respeitados os respectivos limites, os três Poderes são os responsáveis pela governabilidade do país. O Executivo governa, o Legislativo legisla, e o Judiciário garante o cumprimento da lei.
A liminar em tela legislou e governou. Mas, muito pior do que isso, pelo menos para a saúde do cidadão comum, com certeza tornará ainda mais difícil a contratação de planos de saúde individuais, que atualmente já são quase impossíveis de serem contratados.
Nenhum negócio com a despesa maior do que o faturamento se mantém por muito tempo. De outro lado, não se pode obrigar alguém a operar com prejuízo. O resultado dessa equação é o negócio deixar de ser feito. Ao conceder a liminar, o juiz federal, em vez de ajudar o cidadão, afastou dele a possibilidade de encontrar um plano individual como alternativa para fugir das filas do SUS (Sistema Único de Saúde).
E, de quebra, aumentou a insegurança jurídica que diuturnamente atrapalha o Brasil.
Fonte: “Estadão”, 18/06/2018