Na Câmara, os deputados têm aproveitado o fim do atual mandato para aprovar projetos que complicam ainda mais o desequilíbrio das contas públicas. A queda no abismo fiscal continua a ser o principal risco a assombrar o futuro governo Jair Bolsonaro.
Foram prorrogados ontem, até 2023, incentivos fiscais ao Norte e Nordeste, medida cujo impacto fiscal é estimado em R$ 9,3 bilhões até 2020. A recém-aprovada renegociação de dívidas de produtores rurais custará até R$ 34 bilhões. O perdão à dívida da Cemig, “jabuti” embutido no projeto de repartição do Pré-sal, R$ 4 bilhões.
As novas iniciativas se somam a benefícios para transportadoras, microempresários, fábricas de refrigerantes, governos estaduais, produtores de etanol e todo tipo de grupo de interesse com algum tipo de articulação parlamentar. Somados todos os projetos aprovados ou encaminhados neste ano, o custo nos próximos quatro anos é estimado em até R$ 260 bilhões.
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De acordo com as últimas projeções da Instituição Fiscal Independente (IFI), o déficit primário, mesmo em queda, somará pouco mais de R$ 295 bilhões nesse mesmo período. Há uma responsabilidade inequívoca do Legislativo pela aproximação a cada dia mais perigosa do Brasil do abismo fiscal e de uma situação de insolvência crônica. O endividamento público, em torno de 70% do PIB em 2016, deverá chegar a 84% até 2022, segundo a IFI.
Não haverá como o país restabelecer o equilíbrio fiscal sem contar com o apoio dos congressistas. A questão transcende a pauta-bomba deste final de ano. O desmonte da estrutura de privilégios e favorecimentos estabelecida no Orçamento nacional exigirá do próximo governo intensa capacidade de articulação legislativa.
Até agora, contudo, tem sido tímida a iniciativa do governo de transição. Depois do flerte com “bancadas temáticas”, Bolsonaro parece descobrir aos poucos que precisará do apoio de partidos políticos para governar e aprovar projetos no Congresso.
Em busca desse apoio, já manteve contato com lideranças de MDB, PSDB, PR, DEM, PSD e outros partidos. É provável que obtenha maioria na Câmara, embora não se saiba com que extensão ou solidez.
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O primeiro e mais óbvio teste será na aprovação da reforma da Previdência, projeto urgente e essencial ao resgate do equilíbrio fiscal. Nem se conhece ainda o teor da proposta do novo governo na área.
Enquanto a equipe econômica insiste na importância de levá-la a votação já no primeiro semestre de 2019, sinais ambíguos emanam do entorno de Bolsonaro. Há receio de desgaste político ao associar o novo governo de cara a um projeto de natureza impopular. O próprio Bolsonaro falou em fatiar a reforma.
A profusão de pautas-bombas e a tibieza do futuro presidente diante da emergência previdenciária poderão criar uma conjuntura inóspita. Mesmo que o governo consiga receitas extraordinárias com privatizações ou novos leilões para exploração do Pré-Sal, sem reforma, o país continuará à beira do abismo fiscal.
É verdade que os parlamentares deveriam ter mais responsabilidade ao lidar com o Orçamento. Mas não têm. Isso não é exatamente novidade. Pressões por gastos são comuns em qualquer Legislativo. Cabe ao Executivo tentar contorná-las. Só se faz isso com o exercício cotidiano, minucioso e paciente da política. Desafiar essa realidade equivale a tentar desafiar a lei da gravidade.
Conquistar o Parlamento é a prioridade para Bolsonaro. Se não conseguir, não haverá reforma da Previdência, nem como conter a explosão das pautas-bombas, nem como evitar a queda no abismo fiscal. Depois da esbórnia provocada pelos governos petistas, a economia brasileira não aguentará um novo choque. Bolsonaro foi eleito prometendo desfazer as mazelas do petismo. É na área fiscal que precisa fazer jus ao mandato conquistado.
Fonte: “G1”, 12/12/2018
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