As expectativas quanto ao desempenho econômico do Brasil neste ano pioraram bastante desde meados de março. Basta ver o que ocorreu nas pesquisas que o Banco Central realiza junto ao mercado, publicadas semanalmente no Boletim Focus. No final de fevereiro previa-se que o PIB cresceria este ano 2,9%, enquanto a inflação seria de 3,7%. Cinco meses depois, se esperam alta do PIB de 1,5% e inflação de 4,2%.
Sem dúvida, contribuiu para essa deterioração ver que o Brasil caminha para as eleições sem muita esperança de que essas tragam uma solução para os grandes desafios que o país enfrenta na sua economia. Nesse sentido, a paralisação dos transportadores rodoviários de carga funcionou como o grito do menino da fábula, ao apontar que o rei estava nu: ela evidenciou a feroz briga que se desenrola por pedaços do orçamento público, a que o governo reage editando normas que restringem ainda mais o potencial de crescimento do país.
Porém, a paralisação dos transportadores ocorreu apenas ao final de maio, enquanto as coisas começaram a piorar dois meses antes, quando o real passou a se desvalorizar com força, a bolsa caiu e os juros de mercado subiram. E essas coisas não ocorreram apenas no Brasil, mas também em outros emergentes, como a Argentina.
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Isso aponta para a influência do cenário externo, que há anos se apresentava muito favorável. De fato, desde março se observa uma sensível piora das condições financeiras internacionais, afetando os emergentes em geral e, em especial, aqueles com fundamentos econômicos ruins, como é o caso do Brasil.
Ao final de 2016 já se esperava uma piora do cenário externo, em função da gradual normalização da política monetária americana e das políticas prometidas por Donald Trump na sua vitoriosa campanha eleitoral. Mas 2017 acabou surpreendendo, com quedas do dólar e dos prêmios de risco pagos por países emergentes, tendências que se estenderam até o início deste ano. Contribuíram para essa boa surpresa a demora de Trump em aprovar medidas de estímulo fiscal, a redução do risco político na Europa e o desempenho melhor que o esperado da China.
Ao final de 2017 havia muito otimismo sobre o desempenho da economia mundial este ano, prevendo-se uma aceleração do PIB mundial, com o crescimento se espalhando para praticamente todos os países. Ao final do primeiro trimestre de 2018, porém, começou a ficar claro que isso não ia ocorrer. A economia europeia voltou a dar sinais de fraqueza, enquanto na China o crescimento desacelerou, na esteira das políticas de desalavancagem financeira, em especial nos mercados paralelos de crédito. Em cima disso veio a agressiva política comercial americana, misturando questões geopolíticas com comércio exterior, que também contribuiu para abater as expectativas de aceleração do crescimento do PIB mundial.
Com a piora da atividade econômica em quase toda a parte, menos nos EUA, o dólar se valorizou, o que sempre é ruim para os mercados emergentes. Também contribuiu para a alta do dólar a continuidade do processo de normalização monetária nos EUA, inclusive com os juros subindo mais do que esperava o mercado. Outros países, como o Reino Unido e a Zona do Euro, também estão apertando suas políticas monetárias, ainda que com certa defasagem em relação aos EUA.
Nada disso é bom para países emergentes. Como também não o é a significativa elevação do preço do petróleo ocorrida este ano. Esta tem sido causada por uma produção cadente no México e na Venezuela, mas também pelo rompimento do acordo nuclear entre os EUA e o Irã. Petróleo mais alto pressiona a inflação e as contas externas de países importadores líquidos do produto, acentuando a escassez de dólares, em um momento em que os investidores estrangeiros já não estão tão atraídos pelos ativos desses países.
Há pouca dúvida de que o cenário externo muito benigno dos últimos anos ficou para trás e que as condições financeiras internacionais vão continuar piorando para os emergentes, ainda que de forma gradativa. Isso significa que os preços dos ativos desses países vão permanecer pressionados, ainda que o tamanho dessa pressão vá depender da solidez dos fundamentos de cada país.
A conclusão que se tira daí é simples: o próximo governo encontrará um cenário externo mais desafiante que o dos últimos anos. O que reforça a necessidade de ajustar as contas públicas, cuja dinâmica explosiva explica nossa moeda estar entre as que mais se desvalorizaram desde março.
Fonte: “Correio Braziliense”, 29/08/2018
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