O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) deverá julgar até amanhã se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva – condenado por corrupção e lavagem de dinheiro, preso em Curitiba e, segundo a Lei da Ficha Limpa, inelegível – poderá ser apresentado como candidato na propaganda eleitoral no rádio e na TV. É provável também que já indefira a candidatura de Lula, embora tenha mais uma semana para tomar a decisão.
A partir deste fim de semana, portanto, o PT terá de encarar a realidade: seu candidato terá de ser o ex-prefeito paulistano Fernando Haddad, apresentado como vice na chapa de Lula. Mesmo assim, a presidente do partido, senadora Gleisi Hoffman, insiste que Lula será o candidato.
A batalha jurídica poderá se estender até 17 de setembro, quando o nome dos candidatos tem de começar a ser programado nas urnas eletrônicas. Só deverá haver decisão final no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), a que caberá julgar os recursos petistas.
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Num cenário extremamente improvável, em que o STF não toma a decisão antes do prazo limite para a programação das urnas eletrônicas, os votos em Lula poderiam ser todos anulados depois da eleição. Na realidade mais provável, insistir na candidatura Lula é, desde o início, uma estratégia arriscada, fadada ao fracasso.
Por que, então, a obstinação petista? Numa leitura mais superficial, Lula põe seu próprio interesse antes do interesse do partido. Quanto mais cedo o PT definisse Haddad como candidato, mais cedo o eleitor seria apresentado a seu nome, mais cedo ele consolidaria o voto da esquerda, hoje dividido com Marina Silva e Ciro Gomes nos cenários sem Lula.
Como evidência dessa leitura, basta apresentar a posição sofrível de Haddad, em quinto ou sexto lugar nas pesquisas mais recentes, quando apresentado como candidato petista. Ele tem apenas 4% no Ibope e no Datafolha, 6% na pesquisa XP/Ipespe, 5% na BTG Pactual/FSB.
Mesmo quando apresentado pelo Ipespe como o “candidato do Lula”, suas preferências chegam a apenas 13%, embora fique em segundo lugar. A migração de votos de Lula para Haddad também deixa a desejar para o petista. No Ipespe, ele recebe 12% dos votos lulistas quando seu nome aparece sozinho, 32% quando é o “candidato de Lula”. Na FSB, também 12%.
O DataPoder360 divulgou hoje uma pesquisa em que Haddad “apoiado por Lula” tem potencial para atingir até 34% dos votos, patamar semelhante ao de Ciro (35%), Marina (31%) ou Alckmin (34%), mas inferior ao de um candidato genérico apoiado por Lula (42%).
Apenas 17% dos eleitores ouvidos pelo Datafolha consideram que Lula deveria apoiar Haddad caso não concorra, e 60% dos ouvidos pelo Ibope afirmam que não votariam em Haddad “de jeito nenhum” caso Lula o apoie. Diante desses números, parece óbvio que o PT faz um péssimo negócio insistindo no nome de Lula.
Numa leitura mais sofisticada, que leva em conta as possibilidades de segundo turno, a manobra continua arriscada, mas faz mais sentido. Haddad perde em todos os cenários de segundo turno simulados a esta altura. Mas não da mesma forma. Para Alckmin, por 43% a 20% no Datafolha, por 36% a 23% no Ipespe. Para Bolsonaro, por 38% a 29% no Datafolha, por 38% a 32% no Ipespe.
A rejeição maior a Bolsonaro, 39% no Datafolha e 37% no Ibope, torna ele um adversário mais vantajoso para o PT no segundo turno do que Alckmin (26% e 25%, respectivamente). A estratégia petista para vencer a eleição só parece ter um caminho: um segundo turno entre Haddad e Bolsonaro. Em qualquer outro cenário, contra Alckmin ou Marina, a derrota do PT se torna quase certa.
Vem daí a necessidade de levar não apenas Haddad ao segundo turno, mas também Bolsonaro. Tanto o PT quanto Bolsonaro se querem como adversários na segunda rodada, pois ambos apostam em vencer graças à rejeição do adversário, obrigando o eleitor moderado e ainda indeciso a escolher um dos lados, com base no discurso do “voto útil”.
Quanto mais confuso o cenário, quanto menos o eleitor antipetista souber quem tem mais chance de derrotar o PT no segundo turno – Alckmin, Marina, Bolsonaro ou qualquer outro –, maior a chance de votar em Bolsonaro.
Se as pesquisas começarem a mostrar que Bolsonaro perde de Haddad no segundo turno, parte dos eleitores que escolhem o candidato do PSL não necessariamente por concordar com suas propostas, mas apenas para derrotar o PT, migrariam para outro candidato com mais chance de sucesso no confronto, seja Alckmin, seja Marina.
Ao adiar a consolidação da candidatura Haddad, que poderia projetá-lo nas pesquisas, o PT mantém o voto antipetista concentrado em Bolsonaro, seu adversário preferido para o segundo turno. Não se trata, portanto, de mero narcisismo lulista. Inisistir em Lula pode parecer loucura. Mas, mas célebres palavras de Polônio sobre Hamlet, há método nessa loucura.
Fonte: “G1”, 30/08/2018
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