Era uma vez um País rico em petróleo, mas que não sabia usufruir disso. Um País sentado em bilhões de barris em reservas, mas que não sabia monetizá-las.
Na semana passada, dois leilões de petróleo sob o regime da partilha não saíram exatamente como o País e o Governo esperavam.
A razão é simples: do ponto de vista dos investidores estratégicos — aqueles que injetam dezenas de bilhões de dólares num projeto com horizonte de 30 anos, e correndo riscos políticos às vezes incalculáveis — a partilha, ainda mais dando preferência à Petrobras, tem se mostrado um modelo antieconômico, que anestesia o chamado espírito animal.
Antes de entrar nos pormenores, vamos deixar clara a diferença entre a partilha e o regime de concessão, que vigorava antes dele e ao qual o Brasil deveria retornar o mais rápido possível — sob pena de continuar perdendo oportunidades.
Mais de Adriano Pires
Geração distribuída: Fatos e fakes
O Dia D
O tempo não para
É bom lembrar que o petróleo cada vez mais entra em desuso pelos mais diferentes motivos. Por isso, há que se ter pressa em monetizar as reservas do pré-sal.
No regime de concessão, leva o campo a petroleira que faz o maior cheque para o Governo. Tipicamente, o lance mínimo é quase simbólico. É o mercado que avalia o campo, produz concorrência e joga o preço para cima.
Na partilha, o Governo estabelece um valor fixo (o chamado “bônus de assinatura”). Quem quiser competir tem que pagar aquele valor. A concorrência acontece não no bônus, e sim no percentual de barris produzidos (descontados os custos) que o investidor está disposto a dividir com a União.
E é aí que começam os problemas. Sempre com a corda no pescoço, o Governo tem exigido bônus de assinatura (o valor que o investidor paga na frente) muito altos. É preciso lembrar que o investidor nestes campos ficará sujeito ao risco de diversas mudanças de Governo ao longo da vida do projeto. Uma hora o Brasil é Thatcher; outra hora é mais Maduro. O valor dos bônus pode ser alto, mas eles deveriam ser parcelados ao longo de anos, alinhando os interesses do Estado com o investidor.
O segundo problema da partilha é a PPSA, a estatal criada para receber a parte da União e que participa do comitê gestor dos campos.
A razão de ser da PPSA é fiscalizar se o operador do campo não está colocando um sobrecusto para lesar a União. No final do dia, a lei da partilha acabou criando algo similar a uma trading estatal.
Mas a existência da PPSA aumenta o custo de transação e eleva o risco comercial para o investidor porque, como membro do comitê gestor, a PPSA tem direito a vetar o plano de investimento, o que aumenta a incerteza sem que a PPSA invista um dólar sequer.
Enquanto fazia leilões no regime de concessão, o Brasil ia bem. A decisão de mudar para a partilha veio em 2010, no Governo Lula, sem critério técnico e somente olhando para um projeto político de poder.
+ Samuel Pessôa: As medidas fiscais de Paulo Guedes
Quando descobriu o pré-sal, o Brasil ficou guloso. Brasília achou que aquilo era a oitava maravilha do mundo, e que dava ao Brasil um poder negocial maior do que tinha até então. O raciocínio foi: em vez de cobrar do investidor apenas o pedágio de entrada, poderemos cobrar ao longo da vida do projeto. Este modelo vigora principalmente em países da África e na Venezuela.
A realidade se mostrou mais dura. O mundo está cheio de projetos que competem por capital, a América Latina oferece um risco político crescente, e cada detalhe na mecânica dos leilões pode alienar investidores.
É hora de acabarmos com a partilha e voltar à concessão. Caso contrário, a profecia dos sindicalistas será cumprida, e o petróleo permanecerá eternamente nosso.
Fonte: “Brazil Journal”, 11/11/2019