Quem assistiu à entrevista do João Amoedo, na última segunda feira, no programa Roda-Viva, saiu com a certeza de que liberdade é uma das palavras mais usadas - porém menos compreendidas – no discurso político atual, especialmente aqui em Pindorama. Isso dificulta sobremaneira o perfeito entendimento da mensagem de qualquer candidato que se aventure na defesa de ideias liberais.
O economista francês Frédéric Bastiat dizia que, numa sociedade livre, a restrição da lei caberia apenas para evitar e punir a injustiça. Thomas Jefferson é mais específico quando diz que liberdade é a “ação desobstruída, de acordo com a nossa vontade, e dentro dos limites traçados à nossa volta em relação aos direitos iguais dos outros”.
O problema que vejo é que nós não raro nos esmeramos em falar sobre liberdade basicamente em termos do que o governo não deveria fazer, e não nos esforçamos muito para discutir o outro lado da moeda: o que devemos fazer para garantir e preservar a nossa liberdade.
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Essa resposta foi magnificamente dada por Victor Frankl: “A liberdade é apenas parte da história e metade da verdade. A liberdade é apenas o aspecto negativo de todo o fenômeno, cujo aspecto positivo é a responsabilidade. De fato, a liberdade corre o risco de degenerar em mera arbitrariedade, a menos que seja vivida responsavelmente”.
Não por acaso, uma das facetas mais diabólicas do coletivismo é a extinção da responsabilidade pessoal. Em sociedades coletivistas, ninguém deve ser responsabilizado pelos seus atos e os erros humanos são vistos não como resultado de escolhas livres e conscientes, cujas conseqüências devem ser suportadas pelo agente, mas como imposição de alguém mais poderoso, quando não da sociedade inteira.
Embora pouca gente se dê conta, não é por acaso que a negação da responsabilidade individual pela própria vida e bem-estar tornou-se uma das pedras angulares dos movimentos coletivistas. Afinal, se as pessoas fossem responsáveis pela própria saúde, por exemplo, não haveria necessidade de uma agenda política para o estabelecimento de uma boa “saúde pública”, com o estabelecimento de inúmeras restrições em relação a que o indivíduo pode fazer ou consumir.
Imagine uma sociedade liberal ideal em que o estado fosse reduzido a quase nada. Um estado efetivamente mínimo. Por acaso, essa sociedade teria como prosperar sem que indivíduos responsáveis cuidassem de si mesmos, de seus familiares e daqueles que estão dentro de sua esfera de influência? Será que conseguiríamos mantê-la agindo como boa parte de nós faz hoje: clamando por mais leis (“o governo deveria proibir isso!” ou “tal coisa deveria ser obrigatória”) que restrinjam nossa liberdade sempre que algo indesejado ou difícil de lidar acontece?
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O aumento exponencial do estado de bem-estar social, do estado policial e do estado babá em praticamente todos os lugares do planeta só foi possível porque os indivíduos, em conjunto, foram abrindo mão da difícil tarefa de cuidar de si mesmos, sem necessidade de leis para ditar suas condutas. Na verdade, nossa crescente disposição para editar leis que regulem o comportamento individual nos seus mínimos detalhes é uma boa medida do nosso pouco apreço pela liberdade.
Portanto, quando sugerimos mais liberdade como remédio para os problemas sociais, devemos prescrever também outro medicamento, sem o qual o primeiro pode transformar-se em veneno: responsabilidade pessoal. Dito de outra maneira, à medida que nos tornamos mais responsáveis, somos capazes e dignos de desfrutar de mais liberdade. Por outro lado, à medida que nos tornamos menos responsáveis, nos tornamos menos livres. Em resumo, não adianta falar de liberdade, sem falar do outro lado da moeda: responsabilidade.
Fonte: “Instituto Liberal”, 23/05/2018