Na semana passada, tivemos o primeiro debate entre candidatos à Presidência na televisão, um embate que foi percebido pela imprensa e por boa parte dos telespectadores como morno ou desprovido de propostas concretas.
O ponto alto, nos comentários das redes sociais, foi um tal de “Plano Ursal”, que, segundo um dos candidatos, estaria pondo em risco a nação por propor o fim das fronteiras e uma pretensa união das repúblicas socialistas da América Latina.
As postagens jocosas incluíam duas versões de um hino da Ursal, uma delas recuperando uma música cantada pela Xuxa nos anos 1990 e memes, os mais diversos.
Independentemente da diversão proporcionada pelo infeliz candidato, há muito o que se refletir a partir do que vem ocorrendo recentemente no Brasil e sobre os riscos (estes reais) que estamos correndo.
A história nem sempre se repete, mas pode ser boa conselheira. Ao ouvir o debate, lembrei-me do Plano Cohen, de 1937, um documento forjado pelo então capitão integralista Olímpio Mourão Filho (com um título que diz muito sobre o antissemitismo dos anos 1930).
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Este foi utilizado para justificar a decretação do estado de guerra e, certamente, parte do clima de medo que precedeu o golpe do Estado Novo.
Mas não é esse, sem dúvida, o único candidato que, ao adotar uma retórica voltada a instilar o temor no eleitorado, deixa de falar de suas propostas de políticas públicas e de divulgar sua visão para o futuro do país. Além disso, o Brasil não está sozinho, nestes tempos sombrios, ao tentar ressuscitar práticas associadas ao período em que floresceu o nazifascismo.
Madeleine Albright, em seu livro “Fascism, a Warning” (fascismo, um alerta, em tradução livre), chama a atenção para os riscos do uso de expedientes parecidos em países como a Hungria, a República Checa, a Turquia ou a nossa vizinha Venezuela.
Em cada um destes casos, candidatos ou governantes que querem se perpetuar no poder usaram o medo como arma e o ódio em seus discursos.
O perigo adviria da modernidade, com seus costumes “devassos” a corromper as novas gerações, da insegurança advinda do aumento da violência (atribuída a um menor rigor com o crime ou a “esse pessoal dos direitos humanos”), do afluxo de imigrantes ou de uma conspiração em curso, seja dos “comunistas”, seja dos americanos (de acordo com a narrativa mais conveniente ao contexto de cada país).
Manipulando assim os medos e promovendo desinformação, candidatos podem ter acesso estável ao poder, sem ter que liderar um processo de melhoria expressiva e não excludente de seus países. Esse sim é o risco real à democracia que precisa ser enfrentado!
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 17/08/2018