Nosso sistema tributário é um dos mais disfuncionais do planeta. Para o Banco Mundial, o Brasil é o campeão de gasto de tempo para cumprir obrigações tributárias, 1 958 horas anuais. Na Bolívia, a segunda colocada, são 1 025 horas. Na mediana dos países pesquisados, 206 horas.
Ações judiciais e administrativas que envolvem tributos atingem 4 trilhões de reais. Isso acarreta custos com advogados e audiências, revelando ao mesmo tempo a excessiva complexidade do sistema e a decorrente insegurança jurídica.
A complexidade piorou com a Constituição de 1988. Estados e municípios ganharam autonomia para fixar regras próprias, o que contribuiu para a desordem. O ICMS muda setenta vezes por semana em todo o país. No comércio eletrônico, o vendedor precisa conhecer as normas de cada estado onde moram seus clientes, pois é obrigado a cobrar o tributo no ato da venda. É inacreditável!
A bagunça se concentra na tributação do consumo. São três incidências federais (IPI, PIS e Cofins), uma estadual (ICMS) e uma municipal (ISS). O ICMS, cobrado na origem, permite seu uso para atrair investimentos pelos estados, gerando a “guerra fiscal”. Projetos se localizam em função do benefício tributário, e não do melhor uso dos recursos. Centros de distribuição são construídos com base em incentivos fiscais, e não na logística. As decorrentes distorções alocativas resultam em ineficiências e conspiram contra o potencial de crescimento da economia, dado seu efeito negativo na produtividade.
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O projeto de reforma tributária do deputado Baleia Rossi (MDB-SP), sob exame da Câmara (PEC 45), prevê que as cinco incidências serão substituídas por apenas uma: o imposto sobre operações com bens e serviços (IBS), que é o modelo adotado por quase 170 países, incluindo todos os da União Europeia.
Além dos efeitos que provocará na produtividade, a PEC 45 permitirá a desoneração total nas exportações (o que poderá ocorrer em sessenta dias) e nos investimentos — o que não ocorre hoje. O resultado da reforma será a elevação da competitividade de produtos e serviços brasileiros.
Alguns profissionais acusam a PEC 45 de ferir a autonomia dos estados e municípios, o que não é verdade, pois os entes poderão definir as alíquotas do IBS em suas jurisdições. Federações mais fortes que a brasileira, como Alemanha e Austrália, adotam modelo similar.
Para esses especialistas, a alta litigiosidade do sistema tributário poderia ser resolvida com legislação mais clara. Eles defendem, assim, a manutenção da perversa estrutura do sistema. Na verdade, essa estrutura é fonte básica tanto do contencioso fiscal quanto das distorções causadoras de ineficiências, o que inibe o investimento e a expansão da atividade econômica.
A PEC 45, se aprovada, por certo será questionada nos tribunais, tal qual aconteceu com a reforma trabalhista. É provável, todavia, que ela também prevaleça e se transforme na principal alavanca da produtividade e do crescimento da economia, da renda e do emprego.
Fonte: “Veja”, 25/10/2019