Quem desdenhava da delação premiada que o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci fez à Polícia Federal, inclusive os procuradores de Curitiba, que consideraram incipientes as denúncias, agora não tem mais dúvidas de que o depoimento dele é o mais cheio de informações sobre os ex-presidentes Lula e Dilma.
Hoje Palocci deve ir para casa, de tornozeleira eletrônica, mas em prisão domiciliar em regime semiaberto, o que lhe permitirá trabalhar durante o dia. O TRF-4 considerou, por maioria, que a delação premiada foi efetiva para as investigações.
A 8ª Turma ainda reduziu sua pena para nove anos e 10 dias, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, ele que fora condenado pelo juiz Sérgio Moro a 12 anos, dois meses e 20 dias de reclusão em regime fechado.
Palocci admitiu que administrou o caixa 2 que a Odebrecht colocou à disposição do PT, e também que era o “Italiano” ou “Itália” das planilhas da Odebrecht. Um dos dois principais ministros do primeiro governo Lula – o outro foi José Dirceu, que ontem teve sua pena confirmada em segunda instância – Palocci incriminou os ex-presidentes Lula e Dilma, de cuja campanha presidencial foi coordenador.
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Cenários
Segundo seu depoimento, parte do dinheiro da empreiteira Odebrecht seria destinada a gastos pessoais do ex-presidente, inclusive a compra de um imóvel para o Instituto Lula, que nunca foi usado para isso. Essas denúncias corroboram outras, que fizeram de Lula réu em processo da Juíza Gabriela Hardt sobre o Instituto Lula, e o do chamado quadrilhão do PT, pelo juiz Vallisney de Souza, em que Lula e Dilma estão denunciados como réus, além do próprio Palocci, entre outros.
Palocci, nas várias denúncias, contou que o então presidente Lula envolvia-se diretamente em alguns pedidos de propinas. Citou um fato que ocorreu antes mesmo de Lula ser eleito presidente, em 2002, envolvendo o delegado do PT no fundo de pensão da Petrobras, o Petros.
Já naquela época, Emilio, o presidente da Odebrecht, pediu ajuda a Lula, pois estava encontrando dificuldades com esse representante petista na Brasken, que tinha sociedade com os fundos.
Outro momento da delação de Palocci que atinge diretamente Lula foi a revelação de que o ex-presidente Lula mandou que o então presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, encomendasse a construção de 40 sondas de exploração de petróleo para arrecadar propina para campanha de Dilma Rousseff à Presidência naquele ano.
Pallocci relatou uma reunião em 2010 na biblioteca do Palácio do Alvorada, com a presença também de Lula, Dilma, e José Sérgio Gabrielli, em que foram acertadas as compras que serviriam para financiar a campanha de Dilma naquele ano. Gabrielli, por sinal, está indiciado em outro processo, em que se investiga a construção de uma sede da Petrobras em Salvador, onde atuava politicamente.
Ao confirmarem a validade da delação de Palocci, os juízes do TRF-4 denotaram que a base das denuncias está sendo confirmada, ou que Palocci deu indicações firmes que poderão gerar novas investigações.
Indulto
Pelo andar dos votos e comentários paralelos de alguns juízes, é possível prever que o resultado final do julgamento do indulto do presidente Temer de 2017, que deve se encerrar hoje, será favorável à liberdade completa dos presidentes de concederem indulto a quem quiserem, na base que bem entenderem.
Isso vai dar a Temer a condição de aumentar as benesses no indulto deste ano. Uma questão ficou clara, no entanto, nas discussões paralelas. O ministro Celso de Mello, que deve votar a favor do presidente, contou que o então presidente Sarney o consultou sobre a amplitude do indulto, pois queria retirar dele os crimes contra a economia popular.
O decano comentou que era uma época em que a hiperinflação sangrava a economia e o Plano Cruzado tentava contê-la. Uma situação daquele momento, que Sarney levou em conta na hora do indulto.
Agora, vê-se pela generosidade do indulto do presidente Temer, que ele não se incomoda com o momento atual, em que a sociedade exige um combate forte à corrupção e aos crimes de colarinho branco.
Com a permissão do Supremo, Temer poderá favorecer, mesmo que o indulto seja genérico e não pessoal, vários políticos, como Eduardo Cunha, a se livrarem da cadeia.
Fonte: “O Globo”, 29/11/2018