A decadência estrutural da vida coletiva é o maior sintoma da incapacidade governamental dos atuais mecanismos de poder. O fato é que as estruturas da política envelheceram e não mais conseguem responder satisfatoriamente os anseios e reivindicações da sociedade contemporânea. O mais desafiador é que o mundo do amanhã – a ser caracterizado pelo forte impacto da inteligência artificial no mercado de trabalho – exigirá um sistema político dinâmico e responsivo, capaz de apresentar soluções em tempo real à luz de um projeto de futuro arejado, moderno e transformador.
Nesse contexto, a primeira e inadiável medida é o restabelecimento da segurança pública em nossas cidades. Sem cortinas, a epidemia de criminalidade está matando as bases formativas dos vínculos associativos que fazem a democracia possível.
Ora, a segurança é a forma primordial de proteção da liberdade. Quando passamos a viver inseguros, gradativamente substituímos o esplendor da liberdade por medidas de reclusão. Sobre o ponto, o exemplo de nossos lares fala por si só: como a rua virou um lugar perigoso, nossas casas viraram autênticas fortalezas contra a criminalidade ascendente. Assim, sem sentir, vamos abandonando o espaço público para vivermos em ilhas urbanas muradas e cercadas por todos os lados e latitudes.
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Esse fenômeno de recolhimento social é absolutamente danoso ao bom funcionamento da democracia. O ideal democrático pressupõe uma elevada estima pelo espaço público, pois é nas ruas do viver que a liberdade humana encontra a plenitude do seu talento. Quando fechamos as janelas da saudável convivência social, automaticamente nos afastamos dos outros, prejudicando, por consequência, o processo de engajamento cívico à democracia. Aliás, a possibilidade de construção de soluções políticas justas e razoáveis pressupõe a capacidade de diálogo aberto, acessível e integrador, fazendo ecoar dentro dos parlamentos as urgentes necessidades da vida coletiva.
Acontece que a insegurança pública gerou o paradoxo do urbanismo prisional no Brasil: os cidadãos de bem, que deveriam ser livres, ficam presos em suas casas, enquanto a bandidagem fica solta, leve e faceira nas ruas de nossas cidades. E os bandidos hoje estão por tudo, inclusive em altas hostes palacianas…
Sim, nossa democracia foi sequestrada pelo crime e não aguenta mais viver em cárcere privado. O sistema de dominação pelo medo atingiu um preocupante ponto de saturação: além de falir o Estado, as pessoas estão exaustas. O inacreditável é que muitos governantes insistem com métodos de asfixia e esganação: pouco fazem, mas querem mais tributos para manter uma máquina pública desordenada, disfuncional e ineficiente. É lógico que a saída não é por aí. As velhas soluções não são as respostas do futuro.
O momento atual exige pautas e métodos inovadores. Não adianta fazer mais do mesmo. O aumento de impostos, por exemplo, é uma pauta vencida. O problema é que a velha política não consegue pensar o mundo fora do paternalismo estatal. E, aqui, não adianta criticarmos os dinossauros por serem jurássicos; eles são assim, não irão mudar e, atualmente, só querem fugir dos zoos da Papuda, Bangu, Carandiru e adjacências. Logo, essa turma bandida e atrasada não são os players do Brasil do futuro.
Objetivamente, a fronteira tecnológica está mudando o mundo, exigindo um novo estilo de pensar. E, quando mudarmos o pensamento, estaremos aptos a agir de forma diferente. Aqueles que captarem as verticais mudanças em curso, incorporando clareza expressiva e honestidade de propósitos, serão os líderes públicos que nos conduzirão na próxima quadra histórica. Se o ontem foi marcado pelo dirigismo estatal, o amanhã será feito pela soma de talentos individuais unidos em um projeto coletivo vencedor. Juntos, podemos desacorrentar o Brasil e vivermos uma democracia que nos orgulhe. Um ótimo 2018!
Fonte: “Gazeta do Povo”, 03/01/2018
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