Num artigo anterior, escrevi que a baixa penetração do seguro, exceto na carteira de automóveis, é uma boa notícia. E é. Significa muita lição de casa, quebrar paradigmas, experimentar o novo, mas significa também a possibilidade de crescer rapidamente, ainda que o setor não se mostre tão animado, seja lá pela razão que for.
A primeira barreira ao crescimento acelerado do setor de seguros é a desigualdade da renda do brasileiro. Pelo menos metade da população economicamente ativa não tem condições de contratar muito mais do que seguros simples, de baixo valor agregado e coberturas bastante restritas.
A renda média nacional é baixa. Não chega a mil dólares mensais e o número é distorcido pelos ganhos de pequena parte da população que ostenta faturamento na casa das dezenas de milhares de dólares mensais.
O país está sem dúvida nenhuma entre os campeões da desigualdade social e a verdade é que se vê muito pouco no sentido de se mudar esta realidade. Não há investimento público em saúde, educação, assistência social ou segurança. Sem isto não há como se pretender mudar o quadro, até porque a massa à margem do acesso aos direitos mais elementares simplesmente não tem condições mínimas de competitividade no mercado de trabalho.
Estes milhões de brasileiros dificilmente comprarão seguros nos próximos anos ou, se o fizerem, serão produtos simples, como as garantias estendidas, os seguros para celulares e, no caso de compras a prazo, alguma apólice de seguro prestamista.
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Mas existem outras dezenas de milhões de pessoas com potencial econômico para contratarem seguros e proteger a própria vida e o patrimônio. O que é preciso é descobrir como atingir este público, que tem vagas noções sobre o funcionamento do seguro, mas não contrata mais do que o seguro do automóvel.
O primeiro ponto que precisa ser entendido é por que estas pessoas não contratam seguros.
Uma resposta óbvia é porque a maioria delas nunca soube que existem outras possibilidades, além do seguro de veículos e dos seguros de vida e planos de saúde, normalmente oferecidos pela empregadora.
O desconhecimento é ponto fundamental nesta equação. Por que o brasileiro não conhece seguro? Esta resposta, que é múltipla, e depende da região em que a pesquisa for feita, tem impacto direto em qualquer política de disseminação do seguro, como conceito e como produto. Ou seja, tem impacto direto em toda campanha de comercialização que venha a ser feita, visando aumentar a penetração das apólices na sociedade brasileira.
São as respostas a ela que darão os parâmetros para a definição dos produtos, o público alvo e a forma de comercialização.
E é exatamente neste ponto que a baixa capilaridade do seguro se torna uma boa notícia para seguradoras, corretores e outros canais de distribuição, que por ventura se adequem às necessidades operacionais, para se ampliar o espectro a ser atingido.
Existem milhões de imóveis de todos os tipos que não possuem qualquer tipo de seguro. Há espaço para se trabalhar desde apartamentos integrantes de condomínios que já têm seguro até condomínios inteiros que, apesar da obrigação legal, não têm qualquer tipo de garantia.
Existem milhares e milhares de casas sem qualquer tipo de seguro. Da mesma forma que existem milhares de imóveis comerciais na mesma situação.
A maioria das empresas brasileiras não tem seguro e grande parte das que têm algum tipo de apólice estão mal seguradas.
O seguro de transporte de carga é obrigatório por lei, mas a maioria das empresas brasileiras nunca pensou em fazer um seguro deste tipo para proteger seus produtos durante as viagens, tanto faz a que título.
Os seguros para profissionais estão engatinhando e menos de dez por cento dos advogados, médicos, arquitetos, etc. já ouviram falar em seguros para garantir eventuais danos decorrentes de suas atividades.
Além deles, há todo o universo dos seguros para o agronegócio, um mundo a ser explorado.
Neste cenário, quem fizer a lição de casa e definir os campos em que deseja atuar, tem tudo para se dar muito bem.
Fonte: “Estadão”, 13/03/2019