Em 1858, Abraham Lincoln, ao ser nomeado candidato ao Senado por Illinois pelo Partido Republicano dos Estados Unidos, proferiu um discurso que incluía uma passagem que se tornou famosa na história daquele país: “Uma casa dividida contra si mesma não se sustenta”.
Lincoln, um forte defensor da causa abolicionista, referia-se à divisão dos estados entre os que não admitiam escravidão e os que a praticavam e, por consequência, da população, entre escravos e homens livres, no que se percebia como um terreno fértil para a eclosão da guerra civil, o que acabou ocorrendo em 1861.
Utilizo aqui a imagem, não para analisar a chamada Guerra da Secessão, que em quatro anos de duração matou cerca de 3% da população dos Estados Unidos (mais do que as mortes resultantes de todas as guerras em que o país se envolveu), mas para relembrar que a atual polarização que vivemos não é sustentável.
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Hoje no Brasil as tribos, na acepção que Vargas Llosa empresta ao termo em sua recém-lançada autobiografia intelectual, “A Chamada da Tribo”, definem-se por oposição ao “outro” e não por um projeto de país.
O medo, mau conselheiro, tem nos levado a cerrar fileiras junto a quem propuser acabar com “tudo isso que está aí” ou salvar a pátria em risco. Mas o que estes líderes geniais das massas propõem para educação, saúde, saneamento, infraestrutura ou para assegurar que não continuemos com a triste (e justa) fama de um dos países mais desiguais do mundo?
Há muito o que se fazer, mas lembro que países que lograram obter um crescimento inclusivo e sustentável no longo prazo foram os que investiram em educação de qualidade para todos. Sem isso, não há perspectiva de se aumentar a produtividade do país —estagnada em um patamar muito baixo— num contexto em que o bônus demográfico que vivemos deve se extinguir em menos de 12 anos e de sair do ciclo de uma cidadania frágil, vítima certa de líderes populistas.
E como construir educação de qualidade? Não há bala de prata, mas a iniciativa Educação Já do Todos pela Educação recomenda algumas ações prioritárias, entre as quais: investir na atratividade e na profissionalização da carreira de professor, implementar a Base Nacional Comum Curricular de Educação Infantil e Ensino Fundamental, implantar uma política intersetorial articulada para a primeira infância e consolidar um novo modelo de escola para o ensino médio.
Sem isso, estaremos em 2022 nos lamentando da independência não alcançada mesmo depois de 200 anos e da persistência de uma casa dividida que só nos faz levar às propostas equivocadas de líderes populistas.
Fonte: “Folha de S. Paulo”, 21/09/2018